Depois que os Estados Unidos elevaram a voz no diálogo com o Brasil sobre a participação das chinesas Huawei e ZTE na instalação da infraestrutura da tecnologia celular de quinta geração (5G), a Embaixada da China em Brasília subiu o tom em reação à enésima provocação do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP).
Não é por acaso: na terça-feira (25), o ministro das Comunicações, Fábio Faria, indicou o conselheiro da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) Carlos Baigorri como relator do leilão da rede 5G. Seu papel será formalizar um relatório que será submetido ao conselho da Anatel. No dia da indicação, Baigorri projetou o leilão de 5G no final do primeiro semestre de 2021.
Na prática, isso significa que foi dada a largada para o processo mais disputado da guerra fria do 5G. A jornalistas, Faria afirmou que estão prontos "todos os deveres de casa que eram para serem feitos por parte do ministério".
Para quem buscava pistas na comunicação do ministro, ele ofereceu um prato cheio: confirmou que o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), comandado pelo general Augusto Heleno, vai participar do processo, "porque se trata também de segurança nacional". Essa é a tese dos Estados Unidos. Também adiantou que vai à Suíça na próxima semana para visitar "players europeus". Os EUA argumentam que, ao combater a tecnologia chinesa, não estão advogando em causa própria porque os principais concorrentes são a finlandesa Nokia e a sueca Ericsson – embora nos últimos dias os americanos tenham começado a admitir que "alternativas nacionais estão surgindo".
Os tuítes de Eduardo Bolsonaro que provocaram a mais irada reação dos chineses repetiam os argumentos dos americanos, especialmente em relação à Rede Limpa (Clean Network). Afirmou que "o Governo @JairBolsonaro declarou apoio à aliança Clean Newtork, lançada pelo Governo @realDonaldTrump, criando uma aliança global para um 5G seguro, sem espionagem da China".
A coluna já havia relatado que estão publicados no site da Rede Limpa (state.gov/the-clean-network) os depoimentos do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo –"o Brasil é o 50º país a apoiar os princípios da Rede Limpa" – e do secretário para Negociações Bilaterais e Regionais nas Américas, Pedro Miguel da Costa e Silva: "Brasil apoio os princípios da Rede Limpa proposta pelos EUA, incluindo a OCDE, que objetiva promover, no contexto da 5G e outras tecnologias, um ambiente seguro, transparente e compatível, com valores democráticos e liberdades fundamentais".
Mesmo para o novo perfil da Embaixada da China no Brasil, no passado extremamente discreta, o tom da reação diplomática impressiona. Em outras manifestações, o tom havia sido duro, mas nunca tão explícito, especialmente ao ameaçar com "consequências negativas" e com a "responsabilidade histórica de perturbar a normalidade da parceria China-Brasil". Com muito mais assertividade do que a coluna, a representação chinesa também lê os sinais.