A derrubada do veto do presidente Jair Bolsonaro à ampliação da desoneração da folha de pagamento para 17 setores passou pelo maior desafio, que foi garantir a sessão. Às vésperas da data marcada para apreciação, a base governista ensaiou um discurso de falta de quórum para tentar adiar a decisão. Sabia-se que havia votos suficientes, como ficou claro na tarde desta quarta-feira (4).
O Senado confirmou a extensão do tratamento tributário especial até o final de 2021 no mesmo dia. Diante da dificuldade do Planalto de levar adiante sua agenda de reformas, é algo que o governo Bolsonaro devia ao setor produtivo.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, costuma justificar o veto dizendo que não há fontes previstas no orçamento de 2021 para compensar as perdas de arrecadação com a desoneração estendida por mais um ano. É verdade. Mas o Planalto não estruturou sua articulação política sequer para votar o orçamento do próximo ano até dezembro. É provável que isso só ocorra nos primeiros meses depois da virada de calendário.
Em vez de buscar alternativas, Guedes se aferrou à recriação da "não CPMF" como forma de garantir a desoneração parcial para todos os setores. Como não tem apoio, trava a reforma tributária e, até esta quarta-feira (4), havia conseguido travar a troca do recolhimento de 20% sobre a folha de pagamento por um percentual de 1% a 4,5% do faturamento para bancar a contribuição patronal para o INSS. É verdade que a proposta embute perda de receita. Mas a arrecadação pode se recuperar se a economia reagir e elevar o faturamento desses setores, aos quais trata com desdém.
A expressão "à beira do precipício" voltou a ser ouvida para definir a situação fiscal do Brasil. É repetida em Brasília e, o que é mais grave, entre economistas e especialistas em risco político. Enquanto isso, a agenda de reformas segue atolada em meio a uma inédita troca de xingamentos entre próceres da República. Bate-boca não resolve problemas. Se o Planalto não se mover, está demonstrado que é possível avançar à sua revelia.