Com três décadas de atuação em advocacia empresarial – operações de compra e venda, direito societário, mercado de capitais e tributos, entre outras especialidades –, Renato Ochman,
da Ochman Real Amadeo Advogados Associados, observa que os negócios já destravaram –
e começarão a ser fechados –, mas por enquanto mais animados por investidores nacionais.
De São Paulo, o gaúcho acompanha o debate sobre privatizações federais e estaduais, de
CEEE, Sulgás e CRM. Pondera que seria melhor se as reformas viessem antes, mas lembra
que o ótimo pode ser inimigo do bom.
Investidores estão interessados em oportunidades no Brasil abertas por privatizações federais e estaduais?
O ano passado foi muito bom para fusões e aquisições no primeiro semestre, mas no segundo ficou meio devagar, por conta da eleição. Passadas as eleições, mesmo sem nada de novo, o cenário ficou definido, e os investidores, mais entusiasmados. Os negócios começaram a se aquecer, mas não são feitos de um dia para o outro. Há movimento grande de empresas brasileiras e fundos de investimento situados no Brasil. Por motivos óbvios: conhecem melhor o país, estão na moeda local e os ativos brasileiros estavam muito depreciados, baratos. Nos próximos meses, diversos negócios devem ser fechados. Quem teve a visão de que a situação melhoraria e de que ativos estavam baratos, conseguiu encaminhar negócios.
Os estrangeiros estão cautelosos?
Alguns estrangeiros se posicionaram, só que mais devagar. Há diferença de velocidade, até uma certa resistência, por algumas questões. A primeira é que se fala em reforma tributária, assunto importante para qualquer investimento. Mas não se sabe se sai, como será, se será completa ou parcial. E tem a reforma da Previdência, que não impacta diretamente as empresas, mas que se reflete na percepção do Brasil. Há vários estrangeiros interessados e posicionados. Outra questão importante é o fato de que o governo fala em tributar dividendos, hoje isentos no Brasil. É um tema que importa não só a investidores locais, mas aos estrangeiros. Quem
quer investir tem de recalcular, medir o impacto.
Se houver tributação sobre dividendos, mesmo com redução de IR, não se sabe como será. Nos EUA, existem regras para evitar imposto em cascata.
O aceno de que a tributação sobre os dividendos compensaria a redução do imposto de renda (IR) para as empresas não tranquiliza?
O que está anunciado é algo parecido com o que os Estados Unidos fizeram. Mas tem cuidados. Dividendo é uma receita que não é ganho de capital, é um rendimento. Tem natureza diferente. Por isso, dividendo incentiva a renda de qualquer investimento. Se houver tributação, mesmo com redução de IR, não se sabe como será. Quando uma empresa participa de outra e recebe dividendos por isso, poderá vir a ser tributada. Quando distribuir os seus, terá de pagar tributo novamente? Nos EUA, existem regras para evitar imposto em cascata. Por exemplo, uma empresa que participa de outra com mais de 80% do capital está isenta do imposto sobre os dividendos, vai pagar quando distribuir para seus sócios. É preciso cuidado para estabelecer essas regras.
A tributação de dividendos pode ter regras diferenciadas. Por exemplo, uma faixa de isenção para quem ganha até R$ 50 mil no ano.
Você está tentando fazer chegar ao governo uma sugestão, qual seria?
Estou tentando levar uma ideia, começando no meio acadêmico. A tributação de dividendos pode ter regras diferenciadas. Por exemplo, uma faixa de isenção para quem ganha até R$ 50 mil no ano. Depois, incidiria de forma escalonada no tempo. O acionista que mantiver ações por três anos ou mais, ficaria isento. Se vender em menos tempo, paga imposto. Hoje, aplicações em renda fixa funcionam assim: quem mantém por mais tempo paga menos imposto. O conceito do investimento em ações é de que seja de longo prazo. Até para beneficiar pessoas físicas, que ainda são minoria no mercado de capitais no Brasil.
Até esse provável ciclo de privatizações, federais e estaduais, o cenário ficará mais claro?Ninguém tem ainda uma visão muito clara. É preciso definir as regras: se o governo fica
com um pedaço, se vai haver áreas estratégicas, como será o valuation (preço mínimo).
E não adianta ter regras maravilhosas se o preço não for atrativo. O RS tem empresas
boas para privatizar. Se for interessante para o investidor, os interessados surgem, independentemente de grandes movimentos. Ter um quadro completo, com a efetiva aprovação dos projetos federais, até o início das privatizações, seria o ideal. Mas às vezes
o ótimo é inimigo do bom.
As estatais gaúchas podem mesmo interessar investidores, como uma mineradora de carvão em um Estado que usa pouco carvão?
O que a gente tem de pensar é o seguinte: deixando de lado a questão de passivos, se alguns setores não são atraentes nesse momento, imagina em 20 anos. Cabem às regras a serem criadas tornar as estatais atraentes. Uma joia da coroa tem de ter uma regra, um preço muito bom, para que entre bom caixa. No caso de empresas de setor menos atraentes, por mais que sejam vendidas baratas, em 10 anos será pior. O que vai valer lá adiante?