A comunidade diplomática, que já andava preocupada com os movimentos do presidente eleito Jair Bolsonaro, segue à esperada de definições de rumos no Itamaraty. Rubens Barbosa, ex-embaixador em Washington e presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da Fiesp, avalia que o incidente protagonizado pelo ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, e pelo presidente da Apex, Alex Carreiro – que teve sua demissão comunicada, mas se recusa a deixar o cargo – não tem impacto no Exterior.
– O que realmente pode provoca repercussão lá fora são as diretrizes e prioridades. Nesse novo movimento de direita do novo governo, é preciso definir o rumo. Em todas as posses às que assisti nos últimos 50 anos, o ministro das Relações Exteriores dá as diretrizes e prioridades no discurso de transmissão do cargo. Houve considerações, inclusive em hebraico, grego e tupi-guarani, observações genéricas sobre globalismo, mas não diretrizes – pondera o diplomata.
Barbosa explica que a estrutura do Itamaraty é tão hierarquizada quanto as militares, motivo pelo qual
a indicação de Ernesto Araújo, que não é um embaixador sênior, para o comando do ministério, já representou uma quebra de hierarquia. Mesmo assim, pondera que o governo Bolsonaro tem legitimidade para apresentar sua agenda para a área. Só lamenta que não o tenha feito até agora.
– Os governos do PT, na Dilma, no governo Temer, havia as mesmas prioridades, com ênfases diferentes: Mercosul, países em desenvolvimento, que nos governos petistas se chamava Sul-Sul, participação do Brasil no conselho de segurança da ONU, integração regional. Isso são diretrizes, que até agora não são conhecidas. O governo quer mudar, dar uma identidade mais à direita. Foi eleito para isso, agora precisa se definir – avalia Barbosa.
A indefinição sobre o comando da Apex produz maior impacto interno do que externo. A agência foi responsável, nas últimas décadas, por incentivar vários setores e muitas pequenas empresas brasileiras a exportar, com programas de apoio que incluem a participação em feiras internacionais, mas vão muito além disso. Para diplomatas de médio escalão, a recusa de Carreiro em deixar o cargo reforça a quebra de hierarquia no Itamaraty e deixa o ministro em situação delicada. Caso não seja confirmada sua saída, só restaria a Araújo pedir demissão.