Depois de ficar surpresa com a velocidade com que a Atlantic, empresa do fundo britânico Actis, transformou o crônico atraso em obras de infraestrutura, a coluna quis saber mais. O CEO da empresa, José Roberto de Moraes, afirma que um dos "segredos" é a aplicação das ferramentas do Project Management Institute (PMI), que dissemina as melhores práticas de gerenciamento de projetos no mundo, do ponto de vista da eficiência e da ética. Fundada em 2009 no Paraná, a Atlantic teve aporte do Actis no final de 2013, que ficou com 60% de participação. No ano passado, o Actis comprou os 40% restantes, consolidou negócios e hoje é o segundo maior investidor em energia renovável no Brasil, só atrás da CPFL. No Estado, a Atlantic está concluindo com quase um ano de antecipação o Complexo Eólico de Santa Vitória do Palmar.
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Como surgiu a Atlantic?
São empreendedores, com vários negócios, dentre os quais a Atlantic, eles tinham atuação em postos, mas sem conexão com a da antiga rede de combustíveis, e outros segmentos. Viram uma oportunidade em energia renovável naquele momento e constituíram a Atlantic. No final de 2013, a Atlantic foi alvo da primeira investida da Actis no Brasil em energia.
Como se deu o contato entre esse grupo de empreendedores e o fundo?
Foi uma prospecção de negócios. O fundo já tinha interesse em projetos de energia em países emergentes, como é hoje, e também energias renováveis. Fizeram uma prospecção e, naquele momento, identificaram a Atlantic.
A Atlantic foi bem sucedida no leilão e só depois foi buscar investidor?
A empresa estava em fase de crescimento. Havia a oportunidade de leilão e, sem sombra de dúvida, uniu o útil ao agradável. Os projetos eram e são significativos e, obviamente, com a entrada de um fundo com recursos disponíveis naquele momento, se fez uma junção bastante interessante.
Até o fundo entrar, o projeto andava com lentidão. A entrada de recurso deu fôlego diferente?
Alavancou, com certeza. O projeto ainda estava em fase inicial. Quando a Actis entrou, a Atlantic tinha 60 megawatts em operação, nos parques de Eurus Renascença, no Rio Grande do Norte. Claro que a entrada de recursos tornou a empresa mais robusta. Não existiu nada oportunista naquele momento, mas sim um aspecto estratégico. Em meados de 2016, a Actis adquiriu os 40% restantes e, desde meados de junho para frente, a Atlantic é 100% Actis.
Quais os principais fornecedores do parque de Santa Vitória?
Os aerogeradores e a torre são fornecidos pela Acciona, que não tem ligação com o fundo, é espanhola. Agora virou Acciona Nordex, porque ganhou um acionista alemão.
O complexo de Santa Vitória tem diferenciais nos aerogeradores e torres?
Os aerogeradores são de três megawatts (MW) cada (bem acima da média instalada no Brasil, de até 2 MW). As torres de concreto têm 120 metros de altura (as do parque de Osório, um dos mais conhecidos, têm 98 m de altura). Se considerarmos os aerogeradores em operação no Brasil, os de Santa Vitória são os que atingem o maior índice de tecnologia, além de serem os mais potentes. E as torres tiveram pioneirismo porque foi montada uma fábrica de torres de concreto dentro do próprio parque.
Essas características ajudam a aumentar o fator de capacidade?
Sempre tem. Em março deste ano, o complexo que estava em operação em Santa Vitória, tiveram o maior fator de capacidade (quanto da potência total de fato se converte em energia) do Brasil. O nosso parque chega perto de 58% (a média nacional chegou a 42% em 2016). Nosso parque, que também chamamos de Mangueira-Mirim, vem apresentando o maior fator de capacidade da região. Essa vem sendo característica dos nossos outros parques em outros Estados. Estamos entre os três primeiros. Isso é possível com boa qualidade de desenvolvimento de projeto. E temos um centro de operações em Curitiba, em que monitoramos os parques 24h, sete dias da semana. Conseguimos interferir em qualquer ocorrência quase que imediatamente.
Como o parque de Santa Vitória passa a operar a pleno?
Temos todas as liberações para operação comercial plena. Obtivemos a última no início da semana passada. Estamos com 66 aerogeradores em operação e três devem entrar nesta semana. É 93% do total.
Entrando antes do compromisso de entrega, a ideia é oferecer energia no mercado livre (exclusivo para grandes consumidores, como indústrias)?
Sim, estamos prontos quase um ano antes. Esse foi nosso compromisso com acionista e com o Estado. É uma forma de oferecer essa energia, que acaba sendo uma commodity de extrema valia e gera receita para o empreendedor, o que é normal nessas circunstâncias.
É uma forma de acelerar a recuperação de investimento?
Com certeza. Quando você faz uma antecipação, é porque você destinou alguns recursos para fazer essa aceleração. Comprimimos o cronograma, então tem uma série de instrumentos, como bonificação aos fornecedores se conseguirem antecipar. O que contribuiu muito para cumprir esse prazo foi o sistema de gerenciamento de projetos com referências do Project Management Institute (PMI, organização de gerenciamento de projetos que possibilita agilizar a realização), aplicamos e funcionou na prática. Pegamos algumas vertentes da cesta de informações do PMI e pinçamos as que efetivamente iríamos utilizar.
Vocês tem planos de investir em novos projetos?
Temos planos de expansão em Santa Vitória. Cadastramos para o leilão deste ano cerca de 40 megawatts no próprio complexo. Quando projetamos a parte eletromecânica, deixamos uma "folga" para isso. Mas precisamos que o leilão ocorra.
A conexão com a rede da região está resolvida?
A gente acha que está, porque teve aquela entrada dos chineses. Vamos esperar o edital em novembro, quando teremos informações mais consistentes em relação a conexão, transmissão.
A Atlantic tem interesse em participar da privatização do setor elétrico? Ao lado do complexo, há o parque de Geribatu, ativo que será privatizado.
Talvez no futuro, porque nesse ano o Actis consolidou duas investidas no Brasil. Implementou a Echoenergia, empresa de cerca de 800 megawatts, também eólica. E tem uma outra empresa com atuação na América do Sul chamada Atlas, solar. Hoje o Actis é o segundo maior investidor em energia renovável no Brasil, só atrás da CPFL. Estamos terminando Santa Vitória, projeto de R$ 1,3 bi. Estamos começando a implantação, estamos há 10% avanço, de um projeto no Piauí, de 195 MW. É projeto de R$ 1,2 bi.
Há planos para investir em energia solar no Brasil?
Estão desenvolvendo projetos. Tudo passa por tarifa, preço de equipamentos, de financiamento, conteúdo nacional, então é toda uma política que, às vezes, a velocidade do empreendedor é muito maior do que os reguladores do segmento.