Com cerca de 120 mudanças em relação ao conjunto atual de normas que regulam o trabalho, a reforma trabalhista vai alterar profundamente as relações entre patrões e empregados. Além das mudanças mais conhecidas, ainda há uma série de aspectos pouco esclarecidos nas novas regras que vão trazer grandes transformações na forma de fixação de salários, na definição de jornada e, até, na arbitragem do fim do vínculo.
A coluna procurou três especialistas, um em cada área, para que apontassem modificações importantes para trabalhadores, empresas e Justiça do Trabalho, que também terá de se readaptar a partir da vigência da nova redação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
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No trabalho
Paulo Sergio João, professor da PUC-SP
Afinação nas relações
"Terá grande impacto a negociação direta com o empregador de questões antes transferidas para o sindicato, por força de jurisprudência, como banco de horas, compensação de jornada, intervalo para refeição. Passa para o nível individual. Vai ser preciso aprender a conviver com isso. Não será ruim, mas até hoje o trabalhador recebe essas informações por lei, ou pelo sindicato, e pronto."
Bolso prejudicado
"O trabalho intermitente não é bom para o empregado da forma como está, porque não há garantia de ganho e transfere o ônus para o empregado se ele não aparecer depois de confirmar presença no trabalho. É uma condição inexequível, apesar de entender que a relação passa a ser contratual. Não dá garantia ao trabalhador, porque poderá ter 10 contratos, sem que nenhum gere horas de trabalho. Então continua sem salário, mas sai da estatística do desemprego."
Amparo desconhecido
"A opção de contribuição sindical será importante, porque o trabalhador vai descobrir um mundo novo. Muitos não sabem dessa taxa. Eles vão se perceber como parte de um todo, que é o sindicato. Isso é tomada de informação, de consciência."
Nas empresas
Fabio Chong de Lima, advogado na L.O.Baptista
Mais liberdade
"A preponderância do negociado sobre legislado vai mudar principalmente na relação com os profissionais que ganham mais de R$ 11 mil. Sem prejuízo ao que está na Constituição – férias, 13º, FGTS –, será possível negociar de forma direta, sem convenção coletiva. A legislação pressupõe que pessoas nessa faixa salarial possam negociar de igual para igual, mas o ponto de corte foi baixo. Não é faixa salarial de alto executivo."
Mais variável
"Até agora, qualquer tipo de remuneração variável, com exceção da participação nos lucros, tem encargos. Se o profissional recebe R$ 10 mil em bônus, a empresa tem de recolher FGTS, INSS e assim por diante. A nova lei estabelece que premiações são isentas de qualquer encargo. Isso pode fazer com que empresas decidam reduzir o salário fixo e elevar o variável."
Contato direto
"Há previsão de que toda empresa com mais de 200 empregados tenha uma comissão de representação, sem presença do sindicato, para resolver questões do dia a dia. O número de integrantes vai depender do tamanho do quadro. Isso tende a facilitar e tornar mais fluida a comunicação."
Na Justiça
André Jobim de Azevedo, sócio da Faraco de Azevedo
Reação ao TST
"Há mudanças de caráter processual. Uma das intenções é dar freio ao agir dos tribunais, especialmente do TST, que vem editando súmulas aos borbotões, achando que é Poder Legislativo. É reação à postura exageradamente protecionista do TST. Por exemplo, o autor pode não comparecer até três vezes, sem sanção, e o réu se movimenta, leva advogado, tem custo."
Aumento de ações
"Essas mudanças todas serão avaliadas pelos juízes da primeira instância. Muitos avaliam que suscitam inconstitucionalidade. Vai haver resistência. Em vez de uma redução imediata, além dos 2,5 milhões de ações trabalhista ao ano, vamos ter 1 milhão a mais. Isso tende a se normalizar em três ou quatro anos. O prazo vai depender de como vão se comportar, ou se subordinar, os juízes. E de como vai se posicionar o STF, que já chamou a si a responsabilidade. O tempo habitual até chegar ao Supremo é entre cinco e seis anos."
Teto de indenizações
"O STF já refutou o que se chamou, na época, de 'tarifar' as ações de danos morais. Mas os limites máximos podem organizar a indenização pelos chamados danos extrapatrimoniais, com foco no dano moral. Não é uma 'tarifação', mas impõe limites."