Foi tão ruim a repercussão do reajuste salarial aprovado na Câmara – cujo impacto já foi estimado de R$ 50 bilhões a mais de R$ 100 bilhões – para os servidores públicos que o Ministério da Fazenda teve de se posicionar. Em nota divulgada nesta segunda-feira, avisou que o pagamento também estará sujeito ao teto geral das despesas proposto como forma de suavizar o rombo no orçamento. A nota foi vista como uma tentativa de demonstrar que não há mal-estar entre o Palácio do Planalto e a equipe econômica. Lembra algo?
Quando se torna necessário tentar demonstrar que não existe mal-estar, é porque a sensação já está instalada e corroendo relações. É tudo de que o governo não precisa neste momento. Está na equipe econômica todo o capital de ''notabilidade'' da gestão interina de Temer. E boa parte desses nomes só aceitou a missão com a chancela de autonomia de Meirelles.
Houve uma fratura entre Planalto e equipe econômica. O norte das necessidades políticas se separou, com violência, das exigências econômicas. Pode, como as fraturas reais, ser tratada e emendada. Mas pode doer quando se armar uma tempestade, como alegam os portadores de emendas ósseas. E se sabe que o Brasil está longe da proteção total contra tempestades.
O mal-estar provém de pressões distintas. O Planalto tem de assegurar apoio para sua própria sobrevivência – leia-se a votação do julgamento do impeachment no Senado, que já provoca especulações – e apoio legislativo e jurídico para a governabilidade. A equipe econômica tem de construir e sustentar o discurso da austeridade, que inclui medidas impopulares ao ponto de discutir correção de benefícios de R$ 880.
Um dos notáveis do time de Meirelles, o economista Mansueto Almeida, reclamou do que chama de ''impaciência'' do mercado em relação a medidas de ajuste, ponderando que não se faz ajuste em dois meses. O que incomoda o mercado, empresários e contribuintes não é a pressa, é a leitura dos sinais. Anúncios de medidas de longo prazo podem ser benéficos para a percepção de agentes econômicos, desde que se mostrem consistentes – tudo o que não tem se visto nos movimentos erráticos do Planalto.
Isso sem considerar o desejo de Michel Temer de não criar ''jurisprudência'' de que ministros investigados tenham de ser demitidos. Se o que levou Temer, ainda que provisoriamente, à primeira cadeira da República, foi o cansaço geral da nação com corrupção, suspeitas e malfeitos, o mínimo que se esperaria dele é que sequer nomeasse investigados para o primeiro escalão.