Mesclando ousadia e cautela, a rede InterCity de hotéis, que nasceu com uma unidade em Gravataí, chega a 30 no país e se prepara para crescer. Na segunda edição do Fórum Respostas Capitais, Alexandre Gehlen, diretor-geral da InterCity, anunciou a nova aposta da rede: a bandeira Hi!, de proposta econômica e estilosa.
O que ficou do aprendizado na pousada da vó Frida na gestão do InterCity?
Minha vida na hotelaria começou cedo. Meus avós compraram uma pousada chamada Bavária, em Gramado, em 1975, quando eu tinha 12 anos. Frequentava muito nas férias escolares, trabalhando em todas as áreas. Fui pegando gosto. Depois, acabei assumindo outras atividades, como o vôlei, e me afastei. Minha vó, Frida, deu alguns ensinamentos. Ela sempre dizia que não importa o que se está fazendo, o importante é fazer bem feito, que algum dia as pessoas vão reconhecer.
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Entre a pousada e a hotelaria, houve um curso de engenharia química?
Quando percebi que não iria me destacar no vôlei, dei um tempo. Fui estudar química e depois engenharia. Depois de um ano e meio de curso, quando já trabalhava no polo petroquímico, resolvi mudar. Troquei de cidade e fui a Gramado estudar hotelaria. Comecei a trabalhar definitivamente na pousada dos meus avós, que na época tinha cerca de 15 apartamentos. Nesse meio tempo também fiz estágios fora, na Alemanha e na Áustria. Quando eu tinha cerca de 31 anos, recebi um convite de um empresário que tinha interesse em hotelaria. Ali nasceu a InterCity. Não tínhamos um objetivo claro, mas queríamos aproveitar o momento da vinda da GM para o Rio Grande do Sul. Foi daí que nasceu, em Gravataí, a primeira unidade da InterCity.
Qual foi a grande lição do vôlei para a sua carreira?
O esporte coletivo tem muito a ver com o ambiente de negócios. Você tem de compartilhar sonhos e desafios com outros colegas. Tem de fazer com que eles exerçam melhor a atividade naquele momento, quando não está rendendo bem ir lá e sacudir eles, resgatar. Isso a gente vivencia diariamente no nosso negócio. Essa visão de pessoas e de liderança é o que mais se carrega para a vida.
Na época da fundação, já se tinha a ambição de ter uma rede do tamanho que tem a InterCity hoje?
A InterCity nasceu aqui no Estado bem atualizada em termos de tecnologia e serviços. Trouxemos inovações que fizeram dele um sucesso logo no início. Com isso, nosso sócio se motivou para lançar o segundo empreendimento. Vimos então em Porto Alegre a Zona Norte, que era uma região muito depreciada. Identificamos o potencial e construímos um segundo empreendimento, que também foi um sucesso. Nosso plano era de quatro anos, para ver se ficava de pé. No quarto hotel, feito com capital próprio, percebemos que tínhamos potencial.
O que mudou no mercado de financiamento de hotéis?
O Brasil ainda carece de linhas de financiamento para o setor. O segmento cresceu por ser criativo. Quem inovou foi a Accor, que trouxe para o país o modelo flat, que depois virou condo-hotel. A InterCity avaliou que tinha condições para poder prestar serviços nesse modelo. Por coincidência, fomos convidado para prestar serviços a terceiros colocando marca, gestão e know-how. Nosso quinto empreendimento foi nesse modelo. Cuidar de dinheiro de terceiros é completamente diferente, então nos estruturamos para entrar nesse segmento, para ter um diferencial a oferecer.
Como está o projeto do Yoo2, de hotéis de luxo, para Porto Alegre?
A gente percebeu que, ao longo dos últimos 16 anos, a empresa crescia à média de 30% por ano. Em 2010, vimos que viria uma janela de oportunidades. Nesse momento, tínhamos cerca de 16 empreendimentos, e achávamos que poderíamos chegar a 2015 com 50 unidades. Preparamos a empresa para ter um crescimento mais robusto. Encerramos 2015 com 31 hotéis, devemos fechar 2016 com 40, apesar do momento de crise, e com projetos para alcançar 65 empreendimentos. Mas chegou um momento em que tivemos problema de marca. Crescer só em um segmento nos impedia de expandir para outros mercados. Nesse momento, apareceu a Yoo2. Eles nos escolheram como operadora homologada para os empreendimentos deles aqui. A Cyrela vai fazer os empreendimentos residenciais e a Intercity vai administrar os hotéis. Identificamos que o Rio de Janeiro seria o melhor lugar para começar. Vamos abrir lá um pouco antes da Olimpíada. Porto Alegre estava se encaminhando para um cenário de excesso de oferta, mas fizemos estudos e vimos que, nesse segmento, havia espaço. Mas esse estudo foi feito um ano e meio atrás, o momento era outro, então o projeto está em reavaliação. Não dá para ser superficial e dizer que tudo está igual ao que era no ano passado. Estamos esperando o melhor momento.
Ou seja, vai sair, mas não se sabe quando...
Isso. É esse exatamente o ponto.
Então vai ganhar velocidade outro projeto, o da bandeira Hi!, de hotéis econômicos com charme?
Esse projeto veio também daquele período em que identificamos que estávamos presos a um único segmento. O Brasil ainda tem Fizemos um trabalho profundo para construir essa nova marca. Chegamos ao consenso de que deveria ter atributos diferentes aos que os brasileiros estavam acostumados. O Hi! vai carregar um pouco mais de inovação na infraestrutura, com menos serviços. Não terá produção de alimentos, por exemplo, mas o cliente vai encontrar lanches orgânicos, mais saudáveis, sempre à disposição. Estamos com quatro hotéis em construção, e queremos chegar a 10 rapidamente
Até quando vocês esperam chegar a esses 10 hotéis?
A InterCity vai chegar em 2017 com aproximadamente 8 mil quartos. Imaginamos que o Hi! vai crescer com ainda mais velocidade.
Como a hotelaria está respondendo à crise?
A hotelaria corporativa vinha com crescimento muito robusto. Entre 2005 e 2008, crescia dois dígitos todos os anos. O segmento de lazer tinha outro cenário, com dólar baixo, todos viajando para fora. Os resorts estavam apanhando. Pareciam duas áreas diferentes. Nos últimos três anos, a gente começou a perceber uma inversão. Agora, o que era ruim para o lazer passou a ser ruim para o corporativo. No ano passado, tivemos queda real de 9% na relação receita por quarto. Enquanto isso, na indústria do lazer, há crescimento. O brasileiro aprendeu a se preparar para viajar. Nada na vida é bom para sempre ou ruim para sempre.
(Pedro Fonseca, professor de economia da UFRGS) Por que os turistas estrangeiros não estão gastando mais aqui?
O Brasil não está fazendo o dever de casa na construção da imagem. Apesar da Copa e da Olímpiada, ainda temos enormes entraves para trazer clientes de fora. Neste momento, até estamos vendo uma mudança em relação ao turista argentino. Mas nesse caso, é uma questão de dólar, não de infraestrutura. Para se ter uma ideia, dos nossos 3,2 mil quartos no Brasil, 95% são ocupados por brasileiros. Imagine a oportunidade que existe para atrair esses turistas de fora. Por outro lado, o turista americano, por exemplo, tem toda uma burocracia para entrar no Brasil, com a questão do visto. Devíamos facilitar a entrada desses turistas. Isso será feito para a Olímpiada, mas apenas durante o período. Há vários detalhes desse tipo que devem ser analisados. Sem isso, fica difícil melhorar.
(André Ghignatti, da aceleradora Wow) A Airbnb está para a hotelaria como o Uber está para os táxis?
O modelo de negócios do Airbnb - aluguel de imóveis por temporada - sempre existiu, por meio de imobiliárias. O que eles fizeram foi juntar tudo em uma plataforma, cresceram absurdamente e entraram no Brasil por uma carência de hotéis na Copa do Mundo. Qual o reflexo disso no setor? Posso dizer que está refletido muito mais na hotelaria (de lazer) do que no corporativo. Mas na frente, a gente estima que vá se cruzar demais. Por exemplo, as plataformas de vendas online hoteleiras vão estar vendendo residenciais, e o Airbnb vai vender hotelaria. Já percebemos esse movimento. O risco, do nosso ponto de vista, é que está mudando de modelo. Até então, aproveitava-se o apartamento que ficava liberado, e a pessoa aproveitava para ganhar um dinheiro extra. Hoje, em algumas cidades mais maduras, estão sendo construídos prédios inteiros para o Airbnb. Isso é temerário, porque está sendo feito sem ainda haver uma regulamentação desse modelo.