Teve Olimpíada. E foi bem mais bonito do que a Copa, se me permitem a heresia nesse tal de país do futebol. Se não deu tempo para ver todas as provas, jogos e setpoints de matar um do coração, tinha o Bolt (desculpa, ele parece estar sempre aqui) para fazer o que só ele faz em um tipo de prova que me permitia escapar de onde estivesse para ver – mas tinha de ser rápida para não perder o espetáculo que durou menos de 10s nos 100m e menos de 20s nos 200m. Teve, mas ainda tem neste final de semana, com direito a frio e coberta para quem não comprou ingresso para ver os Jogos de perto. E nessa hora sempre bate aquele remorso de não ter tentado o sorteio: "Por que eu nunca lembro que a minha timeline vai encher de fotos de gente fazendo o que eu não me programei para fazer e agora parece tão legal?".
Esta Olimpíada foi tipo um compêndio de feitos insanos (quem diria que Phelps voltaria assim com tudo), de pessoas reais vivendo jornada de heróis (não teve bunda nem cara no chão para Diego Hypolito), de histórias bizarras, para não dizer tragicômicas e vergonhosas (inventar um assalto para enganar a namorada?), de quebras de recordes que pareciam inabaláveis (o último dos 400m rasos era do século passado, a bem dizer) e de mulheres distribuindo tapas na cara da sociedade (sem essa de próximo Bolt ou Phelps, "sou a primeira Simone Biles").
De tanta narrativa que inundou telas e jornais disputando a atenção, teve uma que me tocou mais: a vitória do americano Anthony Ervin nos 50m livres da natação, chegando aos 21s40 na prova mais rápida das piscinas. Não sei bem por que, não chega a ser pelo inesperado. Acho que foi mesmo por acreditar que as pessoas boas merecem coisas boas: Ervin leiloou em 2004 a medalha de ouro ganha em 2000, na mesma categoria, para ajudar vítimas do tsunami que atingiu a Indonésia.
Mas acredito que é porque nos lembra de que a vida vem mesmo em ondas. Tão brega e clichê, porém, verdade. Ervin foi ouro aos 19 anos, em Sydney. E até os 35, quando se tornou o nadador mais velho a vencer uma prova individual nas piscinas, passou por muito perrengue, como abandono do esporte, uso de drogas, depressão e até uma tentativa de suicídio. Fico tentando me colocar um pouquinho no lugar dele para imaginar o sentimento que passa no peito na hora de ver que ainda dá tempo. De voltar ao que se ama fazer, surpreender os outros, ser feliz, ser forte.
Sempre tenho a impressão de que um atleta de alto rendimento vive na linha tênue dos superpoderes e do curto-circuito. Se tecnologias, treinos avançados e descobertas científicas aproximam os homens cada vez mais dos feitos inesperados, também os tornam mais vulneráveis à frustração frente ao que não é controlável.
Talvez nada seja mais simbólico do que o grito de Ervin na saída da piscina, representando a boniteza do esporte em trazer as pessoas de volta à superfície.