(Há vários anos, publiquei, possivelmente aqui mesmo, na minha primeira passagem por esta casa, uma coluna com esse título, e coloquei também num livro, Pensar é Transgredir. Hoje, nesta semana de homenagem às mulheres, decidi republicar aqui, com alguns aditamentos.)
Que o outro saiba quando estou com medo e me tome nos braços sem fazer perguntas demais.
Que o outro note quando preciso de silêncio e não vá embora batendo a porta, mas entenda que não o amo quando preciso de um pouco de quietude.
Que o outro aceite que me preocupo com ele, não se irrite com minha solicitude, e, se ela for excessiva, saiba me dizer isso com delicadeza ou bom humor.
Que o outro perceba minhas fragilidades e não ria de mim nem se aproveite disso.
Que se eu faço uma bobagem o outro goste um pouco mais de mim, porque também preciso poder fazer tolices tantas vezes.
Que se estou apenas cansada o outro não pense logo que estou nervosa, ou doente, ou agressiva, nem diga que reclamo demais.
Que o outro sinta quanto me dói a ideia da perda e fique um pouquinho mais comigo nesses momentos – em lugar de voltar correndo ao seu cotidiano profissional, como se aquela fosse a sua única vida.
Que se começo a chorar sem motivo porque tive um dia daqueles o outro não se irrite se não consigo explicar direito o que foi, mas tenha um pouco de paciência: um abraço carinhoso resolve muita coisa.
Que se estou numa fase ruim o outro seja meu cúmplice, mas sem fazer alarde nem dizendo "Olha que estou tendo muita paciência com você!", como se estivesse me fazendo um grande favor.
Que se me entusiasmo por alguma coisa o outro não a despreze nem me chame de ingênua, nem queira fechar essa porta necessária que se abre para mim, por mais tola que lhe pareça.
Que quando sem querer eu digo uma coisa bem inadequada diante de mais pessoas o outro não me exponha nem me ridicularize.
Que quando levanto de madrugada e ando pela casa o outro não venha logo atrás de mim reclamando: "Mas que chateação essa sua mania, volta pra cama!".
Que se eu peço um segundo drinque no restaurante o outro não comente logo: "Poxa, mais um? Você não ia cuidar as calorias?".
Que se eu eventualmente perco a paciência, perco a graça e perco a compostura em público o outro ainda assim me ache linda e me console.
Que se alguma vez eu lhe perguntar se ainda sou importante para ele, e se ainda me ama, ele não responda meio agressivo: "Ué, mas eu não estou aqui?".
Que o outro – filho, amigo, amante, marido – não me considere sempre disponível, sempre necessariamente compreensiva, mas me aceite com naturalidade quando não estou podendo ser nada disso.
Que, finalmente, o outro entenda que, embora às vezes eu me esforce, não sou, não quero, nem devo ser um tipo de mulher-maravilha. Sou apenas uma pessoa, vulnerável e forte, incapaz e gloriosa, assustada e audaciosa, amorosa e independente: uma mulher.