Uma coisa é o artista produzir sua arte. Bem outra é sua arte ser vista, lida, ouvida, fruída. E outra ainda é o artista entrar em circuito com seu público, de maneira a permitir que surjam e se propaguem ecos de um para outro, feito aquelas pequenas ondas que uma pedra atirada causa na superfície da água calma.
Nem sei se a imagem faz sentido, se faz eco. Uma das minhas grandes admirações é justamente pelos artistas que sabem produzir imagens capazes de gerar esse fenômeno, como uma pedra no meio do caminho, que muda (às vezes para sempre) a rotina de vistas cansadas.
Citei o Drummond, esse da pedra, e não sei se poderia citar outros poetas brasileiros. Já viu que a nossa poesia costuma ser muito mais centrada nas palavras propriamente ditas e em sua musicalidade do que em sua capacidade de gerar imagens duradouras?
Não conheci pessoalmente Fernando Baril, mas agora ganhei a chance de entrar em sua intimidade como artista – ele foi um pintor sensacional – ao ver uma joia de filme, com roteiro e direção de Gilberto Perin e Emerson Souza. Se o prezado leitor não viu, sugiro uma ida ao YouTube (acesse gzh.rs/doc_baril).
O Fernando foi um desses grandes artistas que, pelo seu metiê específico de pintor (num mundo saturado de imagens que talvez nem saiba mais como olhar para as coisas distinguindo o que vale e o que não vale) e pelo fato de viver em Porto Alegre (uma cidade meio inóspita para tantas pessoas de valor), talvez não tenha conseguido fazer essas ondas. Mas talvez ele não tenha tentado; talvez ele nem tenha desejado.
Quando de sua morte, em agosto deste ano, eu estava em deslocamento por assim dizer tectônico, lento, naquela condição de trânsito em que as coisas antigas ainda estão suspensas e as novas ainda não encontraram lugar certo. Soube da morte, li algum necrológio breve (e um desabafo da Eleonora Prado), mas nada além disso. Só agora, quase meio ano depois, pela mão do também artista Renato Rosa, entrei no link para ver o filme. E que lindo filme.
Gilberto Perin é um artista de grande importância como fotógrafo, e antes disso um grande produtor cultural, com uma série de excelentes serviços prestados à cidade e ao país, nos muitos anos em que trabalhou em tevê – esses dias ele ainda foi lembrado por um clipe, o primeiro, feito com o Ritchie, o da menina veneno. Agora ele inventou esse documento amoroso, que mistura doses perfeitas de informação e admiração, nos 26 minutos do filme produzido pela Associação dos Amigos do Margs.