O jornalista Caio Cigana colabora com a colunista Juliana Bublitz, titular deste espaço
O casal Rodrigo Lobato Schlee, 51 anos, e Fernanda Valente de Souza, 48, materializou em um livro o resultado de mais de duas décadas de pesquisas sobre o ofício campeiro de trabalhar o couro cru para criar peças de montaria, vestimentas e utensílios que fizeram parte do cotidiano dos primeiros gaúchos e povos originários da região do Prata. Guasqueiro: A Arte Gaúcha do Couro no Apero Crioulo será lançado na quarta-feira, às 18h, no Foyer do Multipalco do Theatro São Pedro, em Porto Alegre. Junto, será apresentada uma mostra com parte do acervo de mais de mil objetos recolhidos e confeccionados pelos autores. Muitos são ainda hoje de uso corrente na lida de campo, em festividades e em competições. Entre os itens, há até a réplica de um peculiar canhão missioneiro usado nas guerras guaraníticas.
Naturais de Pelotas, Rodrigo e Fernanda têm um relacionamento de 32 anos. O interesse pelo ofício remonta às ligações familiares com a vida rural. Até chegarem ao livro, dedicaram-se a garimpar raras literaturas no Estado, na Argentina e no Uruguai, a viagens a locais históricos também nos países vizinhos, a investigações antropológicas e a busca por antigos guasqueiros nos mais recônditos rincões do pampa nas nações onde foi forjada a figura do gaúcho e nasceu esse estilo de artesania do couro, especialmente após a chegada do gado ao continente.
– É um trabalho que compartilha todas as experiências e pesquisas dos últimos 20 anos. Uma pesquisa profunda sobre a cultura do couro, relacionada à própria formação da identidade gaúcha – explica Fernanda, graduada em Artes Visuais pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel).
– É difícil separar a história do uso do couro da história do gaúcho – diz Rodrigo, advogado formado pela Universidade Católica de Pelotas (UCPel).
No linguajar regional, o homem campeiro também é muitas vezes chamado de “guasca”, palavra do dialeto quechua que significa pedaço ou tira de couro cru.
O reconhecimento da relevância do trabalho para preservar e difundir essa arte fez o casal ser convidado pela UFPel, em 2004, a ministrar cursos de extensão para a formação de novos guasqueiros. Passaram a também a receber encomendas de peças para museus e coleções privadas e serem chamados para assessorar produções audiovisuais, para que os objetos usados, especialmente os aperos (as peças dos arreios), fossem fiéis à época retratada.
O livro conta os primórdios do uso do couro na região, sua versatilidade, mostra aplicações, ferramentas, técnicas tradicionais e explica termos. Rico em imagens, é até uma espécie de manual para interessados em se iniciar no ofício.
Na Capital, a exposição será de 25 a 27 de maio. Depois vai para Pelotas (dias 2, 3, 5 e 6 de junho) e Gramado (dias 16, 19, 20 e 21 de junho), onde o casal vive, tem um atelier e é proprietário da Matería Capitão Rodrigo, comércio cultural e escola do mate com exibição permanente de objetos ligados aos costumes gaúchos. O livro, com patrocínio da empresa Baldo e financiamento da Lei Rouanet, estará à venda durante as mostras por valor promocional de R$ 150. Pelotas (1/6) e Gramado (15/6) também terão lançamento da obra.
Está aí uma bela e meritória contribuição para conservar um aspecto importante da cultura do pampa e ajudar a transmitir esse conhecimento ancestral.