Fora os tambores, chocalhos e flautas indígenas, a viola é o mais antigo instrumento brasileiro. Chegou no início da colonização. “Há documentos sobre índios tangendo a viola no ano de 1583, ensinados pelos jesuítas”, conta Roberto Corrêa, maior estudioso da viola de 10 cordas e sua história, e, para muitos, um dos principais violeiros de todos os tempos. Mineiro radicado desde 1975 em Brasília, graduado em física e em música pela UnB, autor de quatro livros, seis discos individuais e oito em parceria, Roberto está lançando o que considera a síntese de uma vida inteira nos braços da viola”: o DVD duplo A Arte de Pontear Viola. É um trabalho dedicado àqueles que começam a se interessar ou já estão descobrindo o fascínio e a mitologia do instrumento, hoje mais conhecido como viola caipira e que ganha cada vez mais, digamos, fieis. Mesmo no Rio Grande do Sul, que esqueceu a viola durante décadas, o interesse é crescente.
No DVD, de forma didática, Roberto expõe seu método, que tem como base as técnicas ancestrais da prática da viola no Brasil, e trabalha os fundamentos técnicos da viola contemporânea – tudo fruto do contato com mestres da tradição, audição de discos das duplas caipiras desde os anos 1920 e interação com os violeiros atuais, de todos as regiões e estilos. São três capítulos práticos: Mecânica das Mãos, Ritmos Caipiras e Estudos Progressivos. Na parte dos ritmos, por exemplo, ele apresenta, entre outros, cateretê, cururu, arrasta- pé, mazurca, batuque, guarânia, rasqueado, polca, querumana, xote. Quem conhece os ritmos gauchescos tem com o que se identificar, né mesmo dom Paixão Côrtes? Os DVDs são interativos, pode- se seguir tudo, ou ver parte por parte, incluem partituras e tablaturas em pdf. Uma frase de Guimarães Rosa, o escritor dos violeiros, ilustra a capa do álbum e resume a filosofia de Roberto Corrêa: “O mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas – mas que elas vão sempre mudando. Afinam ou desafinam”.
A ARTE DE PONTEAR VIOLA
De Roberto Corrêa
DVD Duplo, didático, patrocínio Petrobras, R$ 79,90, à venda em www.violacorrea.com.br
PALAVRAS E SONHOS – De Luiz Tatit (Dabliú Discos, R$ 29,90)
Há seis anos sem lançar um disco solo com músicas novas, Tatit reaparece como se nada tivesse acontecido – a não ser o amadurecimento do filho Jonas, produtor musical e responsável pelas programações eletrônicas, que dão cor diferencial ao álbum. Um dos maiores letristas da música brasileira, em ação desde os anos 1970, ele não muda de direção. Nem precisa. Desde a primeira faixa, o xote Mais Útil, o CD tem boas doses daquele humor meio chapliniano, filosófico, irônico e disfarçadamente ingênuo, como também na valsa Feitiço da Fila. Dois parceiros de longa data, a cantora Ná Ozzetti e o compositor Zé Miguel Wisnik fazem participações – Ná na bela Planeta e Borboleta; Wisnik em uma das três não inéditas, a tocante moda caipira Tristeza do Zé. Em Palavras e Sonhos, última faixa, Tatit medita sobre a criação artística. Os vocalizes da moçambicana Lenna Bahule brilham no álbum, ao lado de ótimos músicos.
SE A CANÇÃO MUDASSE TUDO – De Manuela Rodrigues
É provável que a maior parte dos leitores não tenha ouvido falar na cantora e compositora baiana. Claro, ela não tem “mídia”. Em termos musicais, no entanto, é melhor que todas as estrelas do axé juntas. “Meu natural é ir num caminho mais complexo, mas agora as canções buscam uma simplicidade maior”, diz, a respeito do terceiro disco (o primeiro saiu em 2003). São 14 músicas, entregues a cinco produtores. A diversidade é unificada pela voz e a personalidade de Manuela, com um resultado consistente. Suas letras, coisa rara, não falam de amor, falam da vida, como em Ventre, sobre o filho por nascer. O álbum tem rock, bolero, marcha-rancho, samba, xote (o primeiro single, Ôxe, Ôxe, Ôxe!, brincando com a visão “sulista” da baianidade). Entre as canções de outros autores, ela reinventa Extra II (O Rock do Segurança), de Gilberto Gil.
(À venda nos shows por R$ 20, download gratuito em naturamusical.com.br)
NAS ESTÂNCIAS DE DZYAN - De Juliano Gauche (Eaeo Records, R$ 20)
Uma frase no encarte intriga o ouvinte: “Dedicado à Ordem da Introspecção Mística”. Depois, fica-se sabendo que o Dzyan do título remete à pensadora esotérica Helena Blavatsky. Mas a música do compositor espírito-santense, influenciada por Rimbaud, Raul Seixas, Pink Floyd, Jovem Guarda e seu conterrâneo Sérgio Sampaio, nada tem de mística, embora seja introspectiva. Na estrada desde 1994, Juliano liderou a banda Solana, com a qual lançou três discos, antes de se radicar em São Paulo e engrenar carreira solo em 2013. Com arranjos de Tatá Aeroplano e Junior Boca, este segundo CD investe na sonoridade do rock dos anos 70, com espírito minimalista. Enterrada no peso da banda, a voz baixa de Juliano diz coisas como “a tristeza a gente esconde quando ri” (em Muito Esquisito). O disco é confessional, melancólico, até depressivo – inclusive no rock-balada Alegre-se. Mas para quem gosta do estilo, é muito bem feito.
A sinfônica tocando na parede
Nada como a parceria dos leitores. Na coluna passada, sobre minha viagem ao Uruguai, cometi deslizes que o jornalista Carlos Daniel Alamón, uruguaio há muito radicado em Santo Antônio da Patrulha, tratou de corrigir.
Primeiro: o Uruguai não é uma federação, não tem Estados, mas municípios
(departamentos).
Segundo: Gaúcho da Fronteira nasceu lá, tem dupla cidadania.
Terceiro: Alamón estranhou minha surpresa quanto ao grafite do rosto de Belchior num muro da cidadezinha de San Gregorio de Polanco: “Ele e sua mulher estavam vivendo lá há mais de ano quando foram descobertos pela TV Globo”. Nesta eu cheguei a ter um alerta do inconsciente, mas não segui o instinto jornalístico...
Para lembrar mais da linda San Gregorio, que tem praia de rio, esculturas pelas ruas, pinturas nas paredes externas das casas e realiza um Encontro Internacional de Artistas Plásticos, divido com você esta orquestra sinfônica “tocando” na lateral de uma residência.