Em uma manhã de sol forte e uma brisa suave que iludia a sensação térmica, um casal de idosos caminhava lentamente na praia. Ela, com uma visível sequela de acidente vascular cerebral, arrastava a perna esquerda e colocava todo o peso do corpo na mão direita dele, um amparo indispensável para que se deslocasse com aquela lerdeza que só os muito velhos aceitam com resignação.
Vieram na minha direção e sentaram-se num banco de pedra, a dois metros da mureta, de onde eu espiava o mundo por cima do mar.
Ela tentou dizer alguma coisa e foi quando percebi que lhe faltava a voz. Não sei o que ela queria mas de qualquer maneira ele entendeu, e sorriu.
Foi então que bateu o vento, levando para longe o chapéu protetor que ela usava. Ele caminhou lentamente, apanhou-o quase embaixo do carrinho do sorvete e voltou remodelando a aba, sacudindo a areia, e recolocou-o na cabeça dela, com o cuidado de recolher as mechas brancas que extravasaram os limites do corpo do chapéu.
Então, aproveitando a proximidade, deu-lhe um beijo de leve nos lábios e recebeu a recompensa de um quase sorriso. Em seguida, tomou a mão esquerda disforme que ela mantinha passiva sobre a coxa e empunhou-a com delicadeza. Primeiro, ficou alisando a superfície das veias salientes, como se as tivesse recém descoberto, depois beijou-lhe a palma e, em seguida, apertou-a contra o peito, como a reconhecer que agora, sim, era ele que precisava de um afago.
O silêncio lhes dava a força necessária para que, alheios a um mundo indiferente, eles vivessem em paz o tempo que lhes restava.
E, com aquele novelo irregular de dedos entrelaçados, ficaram calados olhando o mar. Um desses casais a quem podem faltar as palavras, porque são treinados na utilização de todos os outros sentidos.
O silêncio lhes dava a força necessária para que, alheios a um mundo indiferente, eles vivessem em paz o tempo que lhes restava. Só agora, contando esta história, me dei conta que foi uma pena não tê-los abraçado, agradecendo a aula gratuita de afeto incondicional.