
De tudo o que se pode dizer sobre a anistia, e que ninguém diz, é que não poderia haver neste momento um problema mais desnecessário. Num país tão lotado de problemas urgentes, e com um governo tão incompetente para lidar com qualquer um deles, a última coisa que os brasileiros precisam é de um confronto amargo, rancoroso e, sobretudo, inútil como é o principal debate político que existe hoje no Congresso Nacional. E, pior que tudo, um problema criado integralmente pelo STF. Se não fossem as neuroses cada vez mais estridentes da nossa “Suprema Corte”, como diz Lula, absolutamente nada disso estaria acontecendo. É muito simples: se o quebra-quebra do dia 8 de janeiro tivesse sido tratado da única maneira admissível num país civilizado — ou seja, dentro da lei —, não haveria hoje nem um minuto de discussão sobre a anistia, porque não haveria razão nenhuma para se discutir qualquer tipo de anistia.
O STF entregou-se à tara-padrão das tiranias – praticar vingança em vez de justiça
Se houvesse lei no Brasil, os que participaram dos atos de vandalismo estariam sendo processados e punidos com as penas previstas para atos de vandalismo. Os condenados já teriam, a essa altura, cumprido o suficiente de suas penas para estarem em liberdade. Ninguém, obviamente, estaria pedindo anistia nenhuma. Nunca foi reivindicação de ninguém, nem na “extrema direita”, a impunidade para os participantes; se tivesse sido aplicada a lei, jamais teria se pronunciado a palavra “anistia” no país. Mas não. Em vez de aplicar a lei, o STF, que tem a obrigação de ser seu maior guardião, entregou-se à tara-padrão das tiranias — praticar vingança em vez de justiça.
Usurpou do juízo de primeira instância a tarefa de julgar os delitos, roubando aos acusados o direito essencial a recorrer das suas sentenças. Matou a individualização das culpas, fez julgamentos por lotes e violou o direito de defesa dos réus. Somou os crimes de “golpe” e de “abolição violenta do Estado de direito”, como se fosse possível a alguém fazer as duas coisas ao mesmo tempo. Mais grotesco do que tudo, condenou participantes de uma baderna a até 17 anos de prisão fechada — pena que a Justiça brasileira não aplica nem a assassinos de crianças.
É óbvio, diante desta inundação de aberrações jurídicas, que teria de aparecer uma campanha em favor da anistia. Esperavam o quê? Que ninguém achasse nada errado nas alucinações do STF de Alexandre de Moraes? Era inevitável o surgimento de uma crise, e ela se deve à irresponsabilidade do STF em tomar decisões ilegais e impor aos condenados penas que não guardam a mínima proporção com as ações que efetivamente praticaram. Como o STF se recusa terminantemente a limpar ele mesmo a casa que sujou, a anistia é a única fórmula prática e viável de consertar essa desgraça.