A notícia bombástica da semana (literalmente) no campo da segurança pública gaúcha é a apreensão, pelo Departamento de Homicídios da Polícia Civil, de uma arma antitanque em área urbana de Lajeado. Fomos pesquisar. O bicho é um lançador de foguetes M72 LAW, calibre 66 mm, que foi inventado na época da Guerra do Vietnã e ainda é usado em todos os conflitos modernos, inclusive nos embates Rússia X Ucrânia e Hamas x Israel. Hoje seus principais fabricantes são os EUA, Noruega e Turquia. O Exército brasileiro usa uma arma similar, o AT-4.
No jargão das Forças Armadas, o M72 é chamada de arma anticarro - no caso, carro de combate. Usa um projétil em forma cônica na ponta, colocado pela parte de trás do lançador e com alto teor explosivo, capaz de penetrar na couraça do blindado e incinerar seus ocupantes. A pergunta que não quer calar é: o que faz esse armamento de guerra num depósito de armas de uma facção criminosa gaúcha?
É preciso ressaltar que não se trata de uma facção qualquer, mas da maior em atuação no Rio Grande do Sul, chamada Os Manos. Originária do Vale do Sinos, hoje ela tem tentáculos por todo território gaúcho, inclusive na fronteira com a Argentina e nas cidades com portos de rio e mar (como Rio Grande). Essa capilaridade significa também dinheiro e poder bélico. Até para importar armas de guerra. Fuzis, apesar de caros, são relativamente comuns. Mas lançador de foguetes eu não lembro de ter sido apreendido no Estado. E olha que cubro assuntos criminais há 40 anos.
A hipótese mais provável é que a ideia dos criminosos seja atacar carros-fortes, sempre recheados de dinheiro. Ou algum local blindado, como sedes de transportadoras. Afinal, as facções não lidam apenas com tráfico. Elas também financiam assaltos, cometidos pelos seus membros ou até por quadrilhas independentes, que alugam o armamento e depois o devolvem, junto com parte do dinheiro obtido no roubo. Alguns dos investigados nesse caso, aliás, cometeram assaltos a banco. Outra possibilidade é que os bandidos quisessem atacar algum Quartel-General (QG) de seus adversários, com garantia de morticínio do inimigo.
Em duas ocasiões, fora daqui, vi lançadores de foguetes em área urbana. Ambas no Rio de Janeiro. Em 1993, junto com o fotógrafo Ronaldo Bernardi, conseguimos observar à distância quando traficantes do Morro da Providência (área central do Rio) patrulhavam a favela munidos com fuzis e, pelo menos um deles, com um RPG (em português, granada lançada por foguete). É outro tipo de lança-foguetes, mais simples que o M72. No RPG o projétil é acoplado na parte da frente do lançador e fica visível.
A segunda ocasião foi em 2010, quando as Forças Armadas ocuparam o Complexo do Alemão e de lá expulsaram traficantes da maior facção carioca, o Comando Vermelho. Nessa empreitada estavam também os repórteres Rodrigo Müzell e Cid Martins. A Polícia Militar apreendeu duas bazucas na ocasião (bazuca é o termo usado para modelos de lança-foguetes concebidos na II Guerra Mundial). Eram antigas, mas poderiam fazer um estrago hediondo, sobretudo numa vila apinhada de gente. Naquele caso, é possível que as armas fossem usadas mais para atemorizar. E de fato, são de meter medo.
O recado disso tudo é que a moda nefasta das armas de guerra definitivamente chegou aos bandidos gaúchos. E o simbolismo da ação policial, define o diretor de Homicídios, delegado Mário Souza, é que perderam esse objeto de ostentação no submundo.