Passados quase seis meses de invasão russa na Ucrânia, já é possível dizer que a Rússia está ganhando a guerra. Não significa que a situação é irreversível para o governo ucraniano, mas uma série de fatores faz pender a balança militar-diplomática para o lado do neoczar russo Vladimir Putin.
Num primeiro momento, a vantagem psicológica foi dos ucranianos. A resistência surpreendente deles (ante uma força militar quatro vezes maior) e o apoio do Ocidente com armas e suprimentos deu ao presidente da Ucrânia, Volodimir Zelensky, a aura de herói. É certo que os russos esperavam um blitzkrieg (guerra-relâmpago), com derrubada do governo ucraniano, e ocorreu o contrário. Quase todo o país se uniu em torno do líder, um ex-comediante que não era levado a sério nem por Putin, nem pelas potências ocidentais.
O problema é o quase. Grande parte do leste da Ucrânia é russófono e russófilo. Fala russo e orbita culturalmente em torno da Rússia. Esses moradores da região do Donbass, que lutam por independência desde 2014, viram na invasão russa a chance de vingança pelo que consideram humilhações históricas impostas pelos ucranianos culturalmente ligados ao Ocidente. Não por acaso os ucranianos de origem russa formam a linha de frente da ocupação.
Mas não termina aí. Alguns fatores que indicam supremacia russa na guerra:
Legião Estrangeira: os dois lados desta guerra contam com combatentes estrangeiros. A grande diferença é legal. No lado do governo da Ucrânia não há envio de tropas, formal, por parte de outros países. Os militares forasteiros agem por iniciativa individual (entre eles brasileiros, alguns dos quais já foram mortos). As condições são precárias, e a maioria não fala idioma eslavo. Já do lado russo há ampla solidariedade à Rússia de governos de regiões outrora ligadas à extinta União Soviética, como a Chechênia e Belarus, ambas governadas por simpatizantes de Putin. Eles competem para mostrar quem envia mais tropas e equipamentos, formalmente. Estão direto no front. Um comandante checheno chegou a propagandear:
— Se o presidente Putin não nos impedir, iremos até Berlim.
Conflitos de baixa intensidade: após perceber que seu avanço não seria tão avassalador quanto o esperado, as tropas russas se concentram no desgaste do adversário. Fazem isso mediante bombardeio sistemático de quartéis, de áreas civis em cidades, de infraestrutura (pontes, prédios governamentais), seguido de recuos estratégicos. Isso mina o ânimo do inimigo. A cada novo avanço, o recuo é menor. Dessa forma, a maior parte do leste ucraniano já está em poder dos russos e seus aliados locais. A guerra poderia terminar por aí, mas tudo indica que Putin quer derrubar Zelensky e colocar no lugar dele um governante maleável.
Vacilos diplomáticos do Ocidente: os países ocidentais ajudaram a salvar o governo ucraniano mediante remessa de arsenais e provisões. Só que jamais enviaram tropas. Tentam evitar uma guerra continental, quiçá mundial. Já os russos contam com ajuda formal de tropas de seus aliados. Além disso, a diplomacia ocidental traça limites em suas sanções à Rússia. Isso porque a Europa é dependente de gás e minérios russos. É um problema de difícil solução, até porque a guerra começa a virar paisagem secundária no noticiário ocidental.
O resumo desse cenário, concordam especialistas consultados por este colunista, é que de grão em grão, Putin começa a ganhar a guerra.