Iara Lemos, jornalista gaúcha radicada em Brasília, revelou aos brasileiros como religiosos católicos abusaram durante décadas de adolescentes no Haiti. O relato dos casos de pedofilia, com nome e sobrenome dos envolvidos, ganhou forma no livro "A Cruz Haitiana", lançado em plena pandemia, em 2020.
Iara é um dínamo, que conheço bem porque trabalhou em Zero Hora. Haiti é um assunto caro a ela, que esteve naquele país algumas vezes e inclusive recebeu um prêmio Esso regional (das mais prestigiadas honrarias jornalísticas do Brasil, enquanto existiu) ao mostrar, junto com o fotógrafo Fernando Ramos, o trabalho de freiras naquela empobrecida nação caribenha. Pois foi justo no contato com as religiosas que Iarinha soube de crimes sexuais cometidos por padres. Como ela salienta, em meio a um paraíso tropical (sim, o Haiti também tem esse lado), aqueles que contavam com a confiança da população usaram do prestígio trazido pela batina para negociar com crianças famintas favores sexuais. A fome é uma constante naquele país.
A jornalista assegura que o território haitiano é encarado internamente, na Igreja Católica, como um ponto para despejar seus religiosos pedófilos, vindos de todo o mundo. Não fala por falar. Iara dedicou mais de 10 anos à busca de documentos e depoimentos das vítimas, a fim de provar as violências cometidas por religiosos. Contou, para isso, com ajuda do advogado norte-americano Mitchell Garabedian, investigador de pedofilia que virou celebridade internacional após ter sua trajetória retratada no filme Spotlight, premiado com o Oscar.
No livro, a escritora gaúcha reproduz documentos do Vaticano e das cortes judiciais norte-americana e canadense, que julgaram padres pelos delitos sexuais cometidos em território haitiano. "A Cruz Haitiana" foi lançado em fevereiro na Europa, em Portugal, na famosa Livraria da Travessa, em Lisboa, seguido de um ciclo de palestras. Agora Iara pretende voos mais altos. Já está pronta a tradução da obra para o francês, idioma falado oficialmente no Haiti. A partir de novembro deve ser lançada na Bélgica, França e Suíça.
A nova edição deve contar com a carta mais recente do Papa Francisco em defesa do combate à pedofilia na Igreja Católica. Iara quer mais: entregar ao próprio Sumo Pontífice uma cópia do livro, durante evento para jovens católicos que ocorrerá em Lisboa em maio do ano que vem. Voa, Iara.