A indústria legalizada de cigarros no Brasil é uma das raras a ter motivos para celebrar o ano de 2020. Num efeito colateral curioso, o setor cresceu durante a pandemia de coronavírus. A explicação cogitada é o fechamento das fronteiras, decretado pelas autoridades para tentar conter a expansão da peste.
Em 2018, as três maiores indústrias do Brasil produziram 50,6 bilhões de cigarros. Em 2019, foram 50,8 bilhões, o que mostra estabilidade. Em 2020, durante a pandemia, foram industrializados 57,7 bilhões de cigarros no país. O levantamento é da pesquisa de Produção Industrial Mensal do IBGE, divulgada semana passada.
Executivos da Japan Tobacco International (JTI), que vende no Brasil o Camel, Winston, Djarum Black, atribuem o salto na produção à contenção do contrabando. A explicação é conhecida. No Brasil, 57% dos cigarros vendidos são ilegais. Das 10 marcas de cigarro mais vendidas no país, cinco são piratas. Em sua maioria contrabandeados do Paraguai, esses cigarros não arrecadam impostos e são vendidos abaixo do preço mínimo estabelecido em lei (R$ 5). Mais acessíveis ao bolso dos brasileiros de menor renda, eles são trazidos por organizações criminosas que estão ligadas a diversos outros crimes, como furto e roubo de veículos, assassinatos, formação de milícias e corrupção.
O fechamento da fronteira Brasil-Paraguai durante boa parte de 2020 reduziu a disponibilidade dos produtos ilegais no mercado. E os consumidores de cigarros de menor custo tiveram de se voltar para produtos brasileiros, legalizados.
Aí já temos por que a indústria foi beneficiada. E qual saldo para os brasileiros, fumantes ou não? Com a opção do consumidor por cigarros legalizados, ocorreu aumento da arrecadação do IPI Fumo. Mais impostos pagos, mais retorno de serviços públicos aos cidadãos.
E como ficará após a pandemia, se o contrabando voltar a patamares anteriores? A indústria de cigarros sugere ao governo redistribuição de impostos. Hoje as marcas de tabaco mais caras, curiosamente, pagam menos impostos, e as mais baratas pagam mais. O ideal, ponderam, é a inversão desse modelo, o que contribuiria para diminuir a pirataria, que atinge sobretudo os consumidores de menor poder aquisitivo. E menos contrabando significa menos crimes coligados a ele. A perspectiva é que outros tipos de pirataria tenham recuado, além da ligada ao setor cigarreiro.