Pistolagem, a morte por encomenda, não é muito comum no Rio Grande do Sul. Não aquela do dinheiro pago para que alguém execute. Já foram, num passado distante. Comuns ainda são execuções dentro da mesma quadrilha, por disputa de poder, dívida ou até alguma paixão dividida.
Pois tudo indica que foi por encomenda, um caso clássico de pistolagem, um dos crimes mais impactantes da história gaúcha, o assassinato do ex-presidente do Conselho Regional de Medicina Marco Antônio Becker, 60 anos. Ele foi fuzilado na saída de um bar no bairro Floresta, em 4 de dezembro de 2008. Teria sido morto a mando de um colega de profissão, um outro médico que estava com o diploma pendurado, porque sua cassação estava por ser votada e Becker seria um dos que recomendara a expulsão dele dos quadros da medicina. Isso foi o que a Polícia Civil concluiu, o Ministério Público endossou e a Justiça aceitou, tanto que quatro pessoas irão a julgamento pelo homicídio (o médico, seu assistente e duas pessoas que teriam providenciado a execução).
Pois você leu nesta quinta-feira (8) com exclusividade em GZH que pode não ter sido isso. Uma nova versão para o assassinato, apresentada à Justiça Federal, reúne sete testemunhos que apontam dois ex-PMs como autores da morte de Becker. A versão já circulava na época e não foi aceita pela Polícia. Agora essas pessoas gravaram seus depoimentos e uma até já depôs no Judiciário. O médico teria se rebelado contra chantagens feitas pelos policiais militares. E qual o temor de Becker?
Na realidade, o médico acostumado a acusar seus pares nas sessões em que o conselho analisava erros médicos era um sujeito de vida pessoal atribulada. Acumulou dívidas de centenas de milhares de reais com jogo e colecionou amizades e inimizades numa vida noturna intensa — entre elas, a dos dois ex-PMs. Nada disso faria bem à sua imagem, se exposto à sociedade. Mas, em algum momento, Becker teria cansado das extorsões e, por isso, foi morto. É o que dizem as testemunhas.
Morte mais polêmica que a dele, em anos anteriores, só a do radialista José Antônio Daudt, em 1988, assassinado com dois tiros de espingarda. O matador até hoje não foi descoberto, mas a vida pessoal de Daudt — seus amores, sua intimidade, seus desafetos — virou assunto diário dos gaúchos durante meses.
O assassinato de Becker ainda reverberava na mídia quando outro médico notório, Eliseu Santos (então secretário municipal da Saúde e vice-prefeito de Porto Alegre), foi morto, em fevereiro de 2010. Assassinado a tiros de pistola, a poucas quadras do local onde Becker fora executado.
A morte de Eliseu também seria um complô a unir pessoas que cobravam dele promessas de serviços na prefeitura, uma vingança para a qual teriam sido contratados bandidos como executores. Todos foram presos durante algum tempo, mas nenhum deles foi julgado. No caso Becker, idem. E no caso Daudt, ibidem. Três episódios rumorosos e bombásticos, ainda sem desfecho.