A Brigada Militar decidiu encarar de frente um dos maiores problemas dos seus integrantes: os abalos emocionais decorrentes de uma das profissões mais estressantes do mundo. Policiais em geral, especialmente os PMs, estão submetidos a uma rotina tão ou mais preocupante do que soldados em guerra. Aliás, os que atuam na linha de frente, como as patrulhas táticas, são literalmente isso: militares engajados num conflito urbano, cotidiano. Prender quem está a fim de permanecer solto não é moleza. Pior ainda quando se é alvo de tiros e represálias, algo comum nas abordagens.
É para lidar com as reações inconscientes dos PMs aos abalos emocionais próprios do seu ofício que a Brigada Militar decidiu reforçar seu próprio serviço de atendimento psicológico. Criou o Projeto Anjos, que deve ser lançado no final deste mês e visa divulgar entre os policiais as ferramentas que a corporação tem para prevenir o suicídio e a violência. Algo semelhante ao Centro de Valorização da Vida (CVV), de tão grandes serviços prestados à população em geral a partir do fone gratuito 188. A diferença é que não vai se limitar a um contato telefônico. Aliás, a BM já tem serviços telefônicos desse tipo (não divulgaremos aqui para evitar trotes).
Falamos com o comandante da BM, coronel Rodrigo Mohr Picon. Ele ressalta que a ideia é criar uma grande rede de proteção, com cursos EAD para PMs de todas as graduações, coordenado pelo Departamento de Saúde da Brigada Militar. Em Porto Alegre e Santa Maria existem inclusive hospitais. Já em outras nove cidades há núcleos de apoio psicológico. A ideia é firmar mais parcerias em outros locais do Interior.
A principal preocupação é com os que atentam contra a própria vida. A média entre os brigadianos é de 30,7 suicídios a cada 100 mil habitantes (três vezes maior que entre a população civil), enquanto a média é de 20,9 policiais suicidados em Minas Gerais, 20 em São Paulo, 16 na Bahia e 9,1 no Rio de Janeiro. No mundo, a média é de 18,2 suicídios de policiais (a cada 100 mil pessoas). Ou seja, os PMs gaúchos frequentemente lideram o ranking nacional desse tipo de morte. Em 2018 foram oito casos, em 2019, cinco casos, e em 2020, até agora, três casos.
Mas o Projeto Anjos pretende encarar também a violência em geral derivada da atividade policial. A chefe do setor de Psiquiatria do Hospital da BM em Porto Alegre, major-médica Cláudia Ferrão Vargas, "enfatiza que muitos transtornos mentais podem levar a mudanças de comportamento, inclusive atos impulsivos e agressivos no atendimento a ocorrências".
Agora, em bom português: um policial com problemas emocionais pode descontar isso no trabalho cotidiano. E ninguém quer gente armada e transtornada guarnecendo as ruas. Por isso, longa vida ao Projeto Anjos.