Após dois anos de cobertura da Operação Lava-Jato consegui assistir ao juiz Sérgio Moro num púlpito. Ele palestrou em Novo Hamburgo, em evento do Grupo Editorial Sinos, na universidade Feevale. Primeira constatação: o magistrado não é um grande orador. Em princípio, sequer é alto (piada infame de um amigo presente no evento). O magistrado não exibe o ativismo inflamado de um Leonel Brizola, o fervor quase religioso do procurador Deltan Dallagnol, a simpatia e o carisma do Luiz Inácio Lula da Silva de tempos atrás.
Não. Moro se manifesta de forma tímida, contida. A voz pouco ajuda: de tom agudo, em alguns momentos lembra a de um adolescente. Em nada condiz com o olhar aquilino, penetrante, do magistrado que tem encantado a parte da nação que veste verde e amarelo em protesto contra a corrupção.
Por ser juiz, ele também se obriga a não emitir opiniões personalizadas. Questionado sobre "quando vai prender Lula?", "quando Cunha vai para a cadeia?", Moro driblou a plateia, que esperava grandes lances.
– Não comento futuro. Por dever de ofício, falarei apenas de casos já julgados.
O juiz foi tão cuidadoso que sequer mencionou os nomes dos que mandou prender. O petista José Dirceu virou "um poderoso ministro de um governo que já terminou". Os peemedebistas Nestor Cerveró e Jorge Zelada, condenados na Lava-Jato, viraram "ex-dirigentes da Petrobras, ainda cumprindo pena, que devolveram milhões de reais". Sequer de sua segurança pessoal Moro falou, "por segurança".
Leia mais:
Juiz palestra sobre Lava-Jato em Novo Hamburgo
O perfil de Sérgio Moro, o juiz que sacudiu o Brasil
A entrevista que fiz com Sérgio Moro, por David Coimbra
Após uma detalhada e demorada explanação de uma hora sobre os mais de R$ 6 bilhões surrupiados da Petrobras, Moro abriu para perguntas. E foi então que se permitiu soltar um pouco mais o verbo. "Vocês sabem o que são bilhões? Não sabem, nem eu sei. É dinheiro que não acaba mais, algo incalculável", definiu.
Moro também fez uma linha do tempo dividindo a história brasileira moderna em ciclos. Falou do getulismo, do desenvolvimentismo juscelinista, da ditadura militar – "e seu período de autoritarismo que manietou partidos e pessoas", criticou, num recado contra os que o chamam de direitista. Aí falou do novo ciclo cívico que se abriu com a volta da democracia representativa e de partidos fortes. Chegou enfim ao momento atual, que considera um divisor de águas: o momento de um basta à corrupção.
O juiz exibiu até um vídeo, no qual artistas globais e cantores sertanejos defendem as "10 medidas contra a corrupção" propugnadas pelo Ministério Público Federal (MPF) e endossadas por Moro. A filmagem é repleta de cenas de bandeiras, de verde amarelo, de civismo. Moro finalizou dizendo que discorda quando policiais e procuradores reclamam da lei.
– A legislação possui instrumentos rigorosos. Basta ao juiz usá-los - analisou, em tom de rigidez moral.
E aí listou o número de condenações e prisões da Lava-Jato.Foi aplaudido delirantemente. Ao final, ainda em pé, Moro distribuiu autógrafos durante 15 minutos, para aflição dos seguranças. E saiu com um aceno e sob gritos de "Viva o Brasil".