Desde a pandemia, com a falta de matéria-prima vinda do exterior para vários produtos, voltou-se a falar sobre a reindustrialização do Brasil. O tema agora ganha ainda mais força, porque está dentro das bandeiras do novo governo Lula e deverá ser a prioridade do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC). O programa Gaúcha Atualidade, da Rádio Gaúcha, conversou com o gerente executivo de Economia da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Mario Sergio Carraro Telles. Ele explicou como a principal representante da indústria brasileira, que coordena um sistema formado por 27 federações estaduais, pretende colaborar com a reindustrialização e qual o papel do Rio Grande do Sul nesse objetivo. Confira trechos abaixo e a íntegra no final da coluna.
Como a CNI vê esse debate sobre a reindustrialização? É preciso reindustrializar cadeias inteiras, ou algo precisa permanecer em outros países?
A CNI vê com muita preocupação esse processo de desindustrialização, que vem de antes da pandemia e é histórico no Brasil. A indústria é feita de cadeias de produção. Cada empresa produz parte para um produto final. Isso é o que chamamos de cadeias globais de valor. O mundo inteiro tem rediscutido a localização delas, e entendemos que o Brasil precisa participar desse debate. A CNI apresentou ao governo um plano de retomada da indústria, com uma série de medidas que entendemos serem importantes para que o Brasil se posicione de forma competitiva nas cadeias mundiais de produção. Agora, é impossível pensarmos que tudo vai ser produzido no Brasil. Não acreditamos que toda a cadeia vá ocorrer dentro de um único país. O que precisamos é estar incluídos nessa cadeia, fazendo parte do processo de produção industrial.
O vice-presidente Geraldo Alckmin comenta que o novo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços teria como a principal missão promover um amplo processo para fortalecer a cadeia industrial brasileira, além de ampliar as exportações. O senhor acredita que o governo federal vai conseguir auxiliar a indústria a potencializar essa conquista?
Nós entendemos que é a reindustrialização é, sim, um preocupação legítima e realmente sincera desse novo governo. A CNI tem participado desse debate e já vemos alguns sinais de movimentação por parte do governo de trabalhar com as indústrias pela reindustrialização.
O presidente Lula tem falado sobre a valorização da Base Industrial de Defesa (BID) como parte do progresso tecnológico do país. Qual a sua opinião sobre o assunto?
Nesse plano de retomada da indústria que a CNI apresentou, um dos elementos é o que chamamos de retomada de uma política industrial, mas moderna. São políticas que têm sido feitas por diversos países e passam por "missões", onde atividades industriais são escolhidas para serem trabalhadas. E uma das atividades que a CNI entende que é possível se envolver é no campo da defesa. Uma das missões é estudar medidas a serem tomadas para estimular atividades industriais para defesa. E tem outros campos, como o da saúde, a questão da descarbonização e da energia limpa.
Qual seria o papel do Rio Grande do Sul dentro do processo de reindustrialização?
O Rio Grande do Sul é um Estado historicamente muito industrializado. Vamos pegar um exemplo, já que estamos falando do setor de defesa como uma das atividades do plano de retomada das indústrias. Para contribuir no setor de defesa, por exemplo, o aço é um produto necessário, e tem empresas importantes no Rio Grande do Sul nesse sentido. Mas não só na defesa. O Rio Grande do Sul tem uma indústria forte, bem diversificada, que pode contribuir na retomada de vários setores, como o da saúde. Sem dúvida, pela força e pela diversificação da indústria, o Estado vai ter um papel bem relevante nesse processo.
O governo dos Estados Unidos está investindo muito dinheiro para reconstruir uma cadeia de produção de chips, que foi um item que faltou durante a pandemia. No Rio Grande do Sul temos a Ceitec, que estava sendo extinta e que, agora, como o novo governo, terá a produção retomada e mantida. Na avaliação da CNI, retomar a operação da Ceitec é positivo?
A questão específica da Ceitec não está contemplada no plano da CNI. O que temos defendido com o governo federal na área de chips é que precisamos ter instrumentos de apoio à inovação de modo geral, não especificamente com a Ceitec. Ter incentivos, disponibilização de recursos através do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Ciência e Tecnologia. Dessa maneira, vai passar pela questão, também, dos chips. Nós precisamos ir além dessa questão. A inovação passa por todos os setores. Como mencionei, o setor da saúde. Uma das nossas missões é na indústria da saúde. A inovação é fundamental. A defesa também está muito ligada ao processo de inovação. Então a nossa posição é uma condição mais ampla com relação à necessidade de aprimorarmos os incentivos tributários e o financiamento para a inovação como um todo.
Como você vê o afastamento do presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Josué Gomes da Silva?
É uma questão de uma política interna da entidade. A CNI não toma partido nessa questão. Não entendemos que essa movimentação vai prejudicar o debate de reindustrialização.
Colaborou Vitor Netto
Ouça a entrevista na íntegra:
Coluna Giane Guerra (giane.guerra@rdgaucha.com.br)
Equipe: Daniel Giussani (daniel.giussani@zerohora.com.br) e Guilherme Gonçalves (guilherme.goncalves@zerohora.com.br)
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