A alta do gás natural veicular (GNV) afasta ainda mais os motoristas de aplicativo da profissão que muitas vezes é alternativa de renda extra ou mesmo substituta em um mercado de trabalho afetado pela crise. Para o consumidor, deve piorar o cancelamento e deixar as corridas mais caras. Para o profissional, o impacto é forte no bolso. Com a gasolina acumulando uma inflação de 47,49% em 2021, muitos profissionais optaram pelo GNV como um substituto ao combustível fóssil. O aumento de 27,99% no preço do gás natural agora — por mais que continue sendo mais competitivo que a gasolina — obriga os motoristas a fazerem um novo malabarismo para pagar as contas.

— Desde que os aplicativos de transporte chegaram, muitos motoristas optaram pelo GNV para ter um combustível mais barato. São motoristas que pagaram um alto valor para instalar o kit de GNV, entre R$ 3,5 mil e R$ 5 mil, investiram esse dinheiro, e agora vem essa alta. É injusto isso. Pegou todo mundo meio de surpresa — fala Joe Moraes, presidente da Associação Liga de Motoristas de Aplicativo, a Alma. 

O impacto, claro, é para todos os motoristas que usam GNV, mas chega forte nos que trabalham em aplicativos porque há um problema de reajuste de tarifa e repasse aos profissionais. Quem faz os preços e as tarifas são as empresas. Em setembro, tanto a Uber como a 99 aumentaram a taxa de repasse aos motoristas, mas Joe diz a defasagem ainda é grande. 

— A nossa tarifa está defasada em 55%. A gente precisa trabalhar de 10 a 12 horas para tirar o valor da gasolina e sobrar algo. Aí soma o preço do aluguel ou da manutenção do carro, que também subiu.  Nós estamos pagando para buscar uma corrida de cinco, seis quilômetros. 

Em entrevista recente ao Gaúcha Atualidade, o presidente da Sulgás, Carlos Camargo de Cólon, falou que o preço do GNV continuaria competitivo em relação à gasolina, apesar de mais caro. Joe concorda, mas pondera que o preço de instalação é alto, e é um custo que o motorista precisa absorver sem conseguir repassar para o consumidor. 

— Se o motorista conseguia ter algum lucro com carro com GNV porque roda mais quilômetros por metro cúbico, ele vai acabar diminuindo os ganhos, com certeza. Ainda é vantagem, porque roda mais com metro cúbico do que normalmente rodaria com combustível fóssil, mas muitos vão parar de usar. O kit de instalação é muito caro. 

Ele conclui: 

— A vida do motorista está muito complicada, e não há compressão do mercado no sentido de reajustar os valores, repondo essa defasagem para equilibrar os custos. Não está havendo o equilíbrio, o que está impactando diretamente a vida do motorista. 

Cancelamentos e menos motoristas

Com o avanço do preço do combustível em 2021 — até porque o GNV teve outras elevações fortes ao longo do ano —, muitos motoristas de apps de mobilidade desistiram do trabalho. Além disso, passaram a selecionar as corridas para valer o custo. Com isso, clientes sentiram a disparada no número de cancelamentos e a falta de veículos, o que faz aumentar a tarifa dinâmica, que é mais cara. Empresas de aplicativo, inclusive, cancelaram vários profissionais, o que tem sido questionado judicialmente.

— Aqueles que estão conseguindo outra colocação no mercado, estão largando. Muitos já fizeram do aplicativo uma profissão e trabalham só com isso, estão se virando como podem. Muitos estão largando, e tem também quem esteja entrando por não conseguir reposição — fala Joe. 

Pressão na inflação

Com a tarifa dinâmica e o repasse da alta pelas empresas, o transporte por aplicativo também pesou na inflação. Em alguns meses, ficou entre as principais pressões de alta do IPCA. Desde que o IBGE, alterou a metodologia para atualizar com o perfil de consumo das famílias, o transporte por app passou a pesar mais no cálculo do que o coletivo.

Coluna Giane Guerra (giane.guerra@rdgaucha.com.br)
Colaborou Daniel Giussani (daniel.giussani@zerohora.com.br)
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