Dentro de campo, ele foi um dos grande laterais da história do futebol. Pela seleção brasileira foi campeão mundial em 2002. Atuou em clubes como Palmeiras, Internazionale e Fenerbahce. Mas foi no Real Madrid que viveu o seu grande momento. Foram 527 jogos, 69 gols e todos os títulos possíveis. No ano passado, Roberto Carlos foi chamado para voltar ao Santiago Bernabéu, agora como diretor esportivo das categorias de base, além de representar o clube na parte institucional.
Desde o início do ano tentando fechar essa entrevista, o implacável produtor do programa No Mundo da Copa, da Rádio Gaúcha, Marcos Bertoncello, fechou o contato às 14h desta sexta-feira (19h em Madri). Na capital espanhola, a temperatura estava em 25 graus, com um clima bem diferente da chuvosa Porto Alegre. A capital gaúcha entrou na conversa, afinal o Grêmio pode ser adversário no Mundial do final do ano.
Roberto estava em casa, mas recebia visitas. Com o carisma que o consagrou entre os brasileiros, atendeu o telefonema depois de três chamadas sem sucesso e pediu alguns segundos para ficar sozinho dentro de uma sala. Só depois disso, Bertoncello transferiu a ligação para o estúdio, quando comecei a entrevista. No bate-papo de 20 minutos, teve de tudo: elogios para Renato, comparação com Zidane e Cristiano Ronaldo, seleção brasileira e até a possibilidade de trabalhar no Bahia.
Com o final das eliminatórias, só faltando a repescagem, dá para dizer que o Brasil está no mesmo nível da Alemanha para a Copa do Mundo?
Estive conversando com o Tite aqui em Madri, ele foi muito inteligente na maneira de fazer o seu trabalho para reorganizar a Seleção Brasileira. Deu confiança para os jogadores, todos se sentiram importantes, ele conseguiu recuperar aqueles que foram muito criticados em 2014. O povo brasileiro voltou a sentir confiança no time. O nosso grupo é fortíssimo para ser campeão da Copa. O trabalho foi perfeito. Aqui da Europa, eu vejo as coisas de fora. O Brasil sempre foi favorito.
A classificação da Argentina foi um sufoco, com a vitória contra o Equador na última rodada...
(Roberto interrompe) Já passei por isso...
Pois é, surge a lembrança da Copa de 2002 quando o Brasil também teve dificuldade nas eliminatórias e acabou campeão depois. Você acha que a Argentina pode crescer para a Copa?
O Brasil é o único país que pode ter dificuldade para conseguir a classificação e chegar em uma final de Copa do Mundo e ganhar. Eu não acredito que a Argentina, dependendo só do Messi, consiga fazer isso. Por obrigação, a Argentina tinha que se classificar. Acontece que nós valorizamos muito o que é de fora. O Brasil ganha de 5 a 0, e se acha um defeito. A Argentina ganha, e se acha uma maravilha. Nós temos um dos melhores do mundo, o Neymar, temos o Tite, o Marcelo, e por aí vai.
Depois de trabalhar como treinador, você agora é diretor institucional do Real Madrid, e também desenvolve projetos nas categorias de base. Como está sendo essa experiência?
Tudo é novo. Você sai do campo, sai do banco de reservas como treinador e vai lá pra cima como diretor esportivo e institucional, embaixador do Real. Estou adorando. Também faço um trabalho na base. Sou o mentor de todas as categorias de base do Real Madrid. Trabalho todos os dias passando minha experiência. Durante dois dias da semana, fazemos um trabalho específico forte. Diariamente acompanho também o treino do Zidane.
Como está a situação aí na Espanha com esta questão da tentativa de independência da Catalunha? O ambiente está muito tenso?
Tudo muito tranquilo, sério mesmo. Existe uma lei na Espanha que não permite que a Catalunha seja um país independente, tem muita questão política nisso. Vamos esperar, mas acho muito difícil se conseguir a independência.
Voltando ao seu trabalho na Espanha. Você pretende voltar a ser treinador?
É legal ver o jogo lá de cima, mas o que eu gosto mesmo é do cheiro da grama. Ficar no campo e sentir essa emoção, passei 25 anos da minha vida fazendo isso.
Seu objetivo é ser técnico na Europa, ou teria possibilidade de trabalhar aqui no Brasil?
Vou te contar um segredo então. Tive hoje à tarde (sexta-feira) uma reunião com uma pessoa do Bahia. O Bahia tem interesse que eu seja diretor esportivo ou até mesmo treinador. Eu sinto muita saudade do Brasil, sinto muita falta de voltar a trabalhar no Brasil. Eu acompanho muito todos os campeonatos aí, o gaúcho, mineiro, todas as competições. Meu contrato é de cinco anos com o Real, mas sou livre, posso sair se aparecer uma proposta adequada. É lógico que voltaria para o meu país, mesmo com todas as dificuldades que sabemos que tem.
Você também é ídolo na Turquia. Foi jogador e treinador lá, conhece bem o mercado. O Giuliano foi agora para o Fenerbahce de olho em uma vaga na Copa. Tem um jogador do Grêmio, o Lincoln, que está emprestado para o Rizespor, da segunda divisão. O que é possível falar do futebol turco?
O futebol turco voltou a crescer. Tivemos sete ou oito anos de certa dificuldade com pagamento de contratações. O pessoal gosta muito do Giuliano, e esperam muito dele. Estão investindo muito nos jogadores brasileiros. Mas o torcedor turco cobra muito.
No final do ano, tem Mundial de Clubes. O Real já está classificado, e o Grêmio pode chegar se for campeão da Libertadores. Vocês já estão de olho no Grêmio?
Se tiver um confronto com algum clube da América do Sul, eu gostaria que fosse com um brasileiro. Ainda mais o Grêmio, que está fazendo um trabalho tão bonito com o Renato. Quando se vê um Mundial de Clubes sem um brasileiro na final, dá uma certa agonia. No ano passado foi assim, quando fizemos a final contra um time do Japão. Legal ver quando Grêmio, Inter, São Paulo e Corinthians chegam.
Você acompanhou alguns jogos do Grêmio esse ano?
Eu vejo tudo. Assisto todos os jogos. Ontem fiquei das 22h às 3h vendo jogos do campeonato brasileiro. O Grêmio é um grandíssimo time. Geromel é um grandíssimo jogador. Tem o Luan, o Fernandinho, que até não tem tanta história no futebol, mas está muito bem. Acho que o Grêmio representa muito bem o futebol brasileiro, e o Renato sabe que eu sou fã dele. Quando cheguei à Seleção Brasileira, me concentrei no mesmo quarto que ele, eu e o tenho como um ídolo. Não vou compará-lo ao Zidane, mas tem a mesma característica, aquele treinador amigo, que cobra mas com respeito. Jogador gosta disso, e o Renato tem muito essa característica.
O Renato volta e meia diz que jogava mais que o Cristiano Ronaldo. E aí?
O melhor a fazer é não perguntar mais isso. Ele tem que dizer o seguinte: fui um grande jogador, tive minha época, fiz gol de tudo que é jeito, até de barriga... mas agora comparar (risos), não tem comparação. O Renato foi um grande jogador na época dele, e hoje temos aqui no Real Madrid o melhor jogador do mundo. Mas o Renato é um dos grandes amigos que eu tenho no futebol, e hoje é respeitado no mundo como um grande treinador. Desejo sempre o melhor porque ele merece.
O Adriano Imperador acabou de dar uma entrevista dizendo que quer voltar a jogar futebol profissional em 2018. Você teve uma relação muito boa com ele. Acredita na retomada?
Quando eu estive treinando o Sivasspor, da Turquia, entrei em contato com o Adriano para tentar a contratação. Eu sabia que poderia recuperar ele. Infelizmente ouvi um não. Mas é um grande amigo, tenho um carinho enorme. Vai depender dele. Eu vou dar todo o apoio. Agora, para conseguir, tem que ser atleta profissional de futebol, tem que acordar todo dia às 7h, ser o primeiro a chegar e o último a sair. Tem que controlar a bebida, o sono e voltar do zero. Se ele se cuidar pode ter mais uns cinco anos no futebol.