O Brasileirão começa com uma importante novidade para a arbitragem. A partir de agora, haverá uma mudança de interpretação nas jogadas em que há toque de mão na bola em jogadas de gol. Caso a bola bata na mão de um atacante de maneira acidental, o lance só será considerado irregular se a bola entrar diretamente para o gol ou se ocorrer imediatamente antes da finalização do próprio jogador.
Se esse toque acidental no braço de um atacante ocorrer antes de um passe para que um companheiro de equipe marque ou tenha a oportunidade de marcar um gol, o lance passará a ser considerado legal.
Até o campeonato do ano passado, esse tipo de jogada seria anulada sem interpretação. Vale ressaltar que essa mudança só vale para toques acidentais ou involuntários. Em outros casos, os lances deverão ser interpretados como as demais situações de mão na bola e bola na mão.
Essa alteração foi ressaltada como a principal novidade para o campeonato que está começando em conversa que tive na última semana com o chefe de arbitragem da CBF, Leonardo Gaciba.
Entretanto, o principal ponto que me chamou atenção no papo foi o fato de que haverá uma cobrança forte para que os árbitros não permitam reclamações fortes e exagero dos jogadores em campo. Acredito que isso seja extremamente positivo para o andamento dos jogos, pois o comportamento dos jogadores no ano passado passou muito longe do ideal.
Abaixo, coloco alguns dos principais pontos da conversa e também disponibilizo a íntegra do áudio da entrevista. Confira:
Quando será possível operar o VAR direto da central que a CBF está montando no Rio de Janeiro?
Eu acho que mais do que uma central é um sonho antigo da arbitragem brasileira. A arbitragem passa a ter um espaço físico só seu. É um Centro de Excelência da Arbitragem Brasileira (CEAB). Os árbitros de vídeo já estão tendo cursos no nosso auditório. Dentro desse espaço nós teremos dez cabines de vídeo, o VOR, como chamamos a Video Operation Room. Não vou dar um prazo, pois há coisas que não dependem de mim, mas acredito que já no inicio do segundo turno estaremos fazendo todas as transmissões desse local. O campeonato começa de uma forma local, com era no ano passado, com as cabines nos estádios, e posteriormente vamos implementar jogos, acredito que na segunda ou terceira rodada, offline, até ter segurança total na passagem da fibra e ancoragem. Uma coisa é fazer dentro de um estado brasileiro ou, por exemplo, na Espanha e outra é no Brasil, que é um continente. Aguardamos a chegada da fibra e já temos uma empresa contratada. A partir daí vamos fazer todos os jogos de um local só e será muito interessante. Agora, não vai ser só árbitro de vídeo. O mais legal é que a arbitragem passa a ter uma independência física também. Isso vai mostrar um processo de muita transparência e independência dentro de suas decisões.
Há um debate muito grande sobre a linha de interferência do VAR. Qual o modelo ideal para a CBF?
Acho que esse é um debate que não é da CBF. É um debate mundial. O que é um erro claro e óbvio? Essa é uma pergunta para fazermos. É importante dizer que não é um erro grosseiro, mas é um erro comprovado. É isso que o árbitro de vídeo tem que ter na cabeça. Quando ele tem uma imagem com erro comprovado dentro da cabine, ele deve fazer a chamada do árbitro. Ao mesmo tempo, ele também está ali para ratificar muitas decisões que são tomadas dentro do campo de jogo. Na verdade, nesse campeonato brasileiro, em aproximadamente 92% das decisões que os árbitros tomaram, o árbitro de vídeo simplesmente disse "segue a decisão de campo". Em só 8% ele chama o árbitro para a revisão. Os números no Brasil são muito semelhantes ao mundo. Essa linha de interferência está em constante estudo. Eu gosto do árbitro de vídeo que entra o mínimo possível, mas o que vai dizer isso é o nível da qualidade do campo. Nós temos que trabalhar bastante a arbitragem do campo. Tentar de maneira máxima aproximar critérios, em especial para aqueles que estão dentro da cabine, porque estamos falando de um campeonato de 380 jogos. Temos que estar muito atentos para que a gente cada vez use menos o VAR para ter mais fluência e velocidade de jogo. Essa é a combinação ideal: precisão, velocidade, comunicação. Esses são os três itens com que a gente trabalha.
Haverá alguma orientação específica para punir a falta de respeito dos jogadores com as decisões da arbitragem?
Nós vamos apertar o controle disciplinar das áreas técnicas e do jogo. Ninguém vai ficar expulsando 50 jogadores por rodada, mas vamos aplicar a lei. Nós precisamos fazer um movimento para que todo mundo se conscientize que o futebol é um produto. Um produto que é vendido para o mundo. Quem quer ficar vendo briga e discussão? O que o povo quer ver é jogada bonita, é o golaço, é a questão de uma equipe bem construída. É luta, mas não guerra. Então eu acho que faremos a nossa parte. Já armamos de forma muito clara, e isso está dito para todos os clubes de futebol do Brasil, o STJD está sabendo. Os membros do Departamento de Competições, o delegado indicado para o jogo irá fazer um controle nas arquibancadas também para ver quem está exagerando, quem está quebrando protocolos, porque é um futebol sem torcida e quem está lá deve estar trabalhando e representando o clube. E deve se portar como tal. Nos bancos de reserva vamos tomar um cuidado especial para que as pessoas tenham a conduta correta. Eu acho que é uma questão de respeito não com árbitro, mas com o futebol como um todo. Respeito com as regras, com o jogo, respeito com o telespectador, com o seu companheiro. É importante a gente passar a mensagem que os árbitros que não aplicarem isso sofrerão as consequências. Autoridade, sem autoritarismo.
O que aconteceu no Brasileirão passado que não pode se repetir agora?
Um árbitro perder o controle do jogo. Isso não pode acontecer de novo. É dentro daquela linha que você colocou, que um árbitro lida com credibilidade e respeito. Vou cobrá-los muito forte a respeito disso. Num campeonato como esse, de pontos corridos, a decisão tomada na rodada um e na rodada 38 tem o mesmo peso na tabela. É importante que desde a primeira rodada a gente mantenha o controle do jogo.
Antigamente os clubes cobravam a CBF por erros de arbitragem. Hoje as reclamações são direcionadas, em grande parte para o "Seu Gaciba". Você fica incomodado com isso?
A gente pode ver de duas maneiras. Quando você fala a CBF é porque você não tem com quem falar. Hoje em dia o clube de futebol tem com quem falar, sim. Existe um comando na arbitragem brasileira, existe um comando dentro da comissão de arbitragem nacional, e essas portas estão abertas. Se eles dizem "vou falar com o Gaciba" é sinal de que eles têm espaço pra isso. Acho que isso é respeito com os clubes. A arbitragem não é inimiga de ninguém. Está lá para fazer o seu trabalho e acertar o máximo possível, como eles, e é cobrado de uma forma forte. Se a gente chega a 98 ou 99% de acerto, a gente é cobrado por aquele um ou dois por cento, e isso é muito tranquilo, muito natural.