Não há nada mais difícil para um jornalista do que fazer a cobertura de uma tragédia. Ao mesmo tempo em que é necessário narrar os fatos, é preciso ter sensibilidade, porque do outro lado estão pessoas arrasadas emocionalmente. É um desafio conseguir retratar o drama e transmitir as informações.
A Carta da Editora dedica o espaço para os relatos de profissionais da Redação Integrada de Zero Hora, GZH, Rádio Gaúcha e Diário Gaúcho que estiveram presentes nas localidades atingidas pela enxurrada no Vale do Taquari.
André Malinoski, repórter - “Considero a cobertura realizada em Roca Sales como a mais difícil já feita na minha carreira de repórter. Ao chegar, ainda nas primeiras horas da manhã, as pessoas caminhavam como zumbis, pareciam anestesiadas, sem saber para onde ir ou a quem recorrer. O impacto visual do cenário, com casas destruídas, postes e árvores caídas, além de carros virados, foi estarrecedor. Muita gente chorava. Havia mortos sob os escombros. Roca Sales foi varrida pelo Rio Taquari. Foi muito difícil separar minha missão como testemunha ocular dessa tragédia. Fiquei muito emocionado pelas perdas das pessoas. Me coloquei no lugar delas o tempo inteiro.”
Leandro Staudt, comunicador – “Foi uma enchente histórica, o rio praticamente dobrou de tamanho em 12 horas. Eram municípios sem energia elétrica, sem água, sem telefonia, sem internet. Áreas incomunicáveis, gerando aflição de familiares e parentes que estavam longe. Se falava que era a pior enchente desde 1941.”
Yasmin Luz, repórter – “Uma moça, mãe de três filhos, ela e o marido estavam com água no pescoço, tentando tirar o que sobrou das coisas deles. Era muito triste. Ela chorava desolada, porque tinha perdido tudo.”
Jefferson Botega, repórter fotográfico – “O Rio Taquari subiu muito, 25 metros, e foi levando tudo que vinha pela frente em Muçum. Tinha uma casa no meio da rua, que tinha sido arrastada, sofá em cima de muro, colchão em cima de árvore. As pessoas vagando pelas ruas, sem saber para onde ir. É uma cena que a gente vê em filme e que agora está aqui, muito próxima.”
Paulo Germano, comunicador – “Lembro que o prefeito de Roca Sales chegou a dizer que durante um tempo a cidade era um grande grito de socorro. Se passava pela cidade de barco, porque estava submersa, e se ouvia muita gente gritando por socorro. Chegou um momento em que não conseguiam mais gritar, o frio era tamanho que as pessoas entraram em hipotermia e não conseguiam mais pedir ajuda. O resgate não conseguia chegar. É muito triste.”
Lucas Abati, repórter – “Fui ao hospital de Roca Sales, que em dezembro passado completou 90 anos. Os relatos são de que nunca tinha entrado água lá dentro. A gente conseguiu ter uma dimensão maior ao ter acesso ao segundo andar. Materiais, prontuários e anotações que foram perdidos.”
Mateus Bruxel, repórter fotográfico – “Uma família esperava por ajuda no segundo andar da casa. Eram oito crianças e seis adultos. O primeiro andar já estava submerso. Foram necessários dois barcos, com ajuda de bombeiros e policiais para remoção com segurança da família pelas ruas alagadas pelo Rio Jacuí.”
Fábio Schaffner, repórter – “Os anos vão passando e o jornalismo nos ensina que o que a gente sabe da vida é nada. Jamais vou esquecer o olhar dos moradores de Muçum, a desolação de quem lutou pela própria sobrevivência. Mas, em meio ao caos da cidade arrasada, também vi a fraternidade das pessoas, ajudando na limpeza da casa do vizinho, entregando uma garrafa d’água ou simplesmente dando um abraço. É com a força dessas pessoas que Muçum será reconstruída.”
Os depoimentos de parte da equipe com imagens dos locais podem ser acessados em GZH.