A pandemia está acabando com os apertos de mão. Até que enfim. Nunca gostei de apertar mãos. Até porque, francamente, esse é um costume superestimado. Quando era guri, os adultos davam aulas sobre como apertar bem uma mão. O "homem", diziam, precisa ter um aperto firme. Denota sua força, seu caráter íntegro, sua personalidade marcante. Uma que se estende mole para o cumprimento significa que o homem que está atrás dela é inconfiável. Afinal, ele não está cumprimentando com vontade, ele não está feliz de encontrá-lo. Ele é traiçoeiro. Cuidado com ele!
Essa crença, além de carecer de comprovação científica, fez com que homens de todas as idades se transformassem em trituradores de falanges, falanginhas e falangetas. Mas os piores são os mais velhos. Não os velhos: os mais velhos. Os maduros, digamos assim. Quando conheço um sujeito de certa idade, cheio de energia e disposição, e ele dá um bom dia vigoroso, estilo Mourão, e me apresenta aquela mão do tamanho de uma raquete de tênis, já sei: trata-se de um maldito quebrador de metacarpos.
É horrível.
Existe também uma grossa polêmica sobre o tempo em que uma mão deve ser apertada. Tem caras que capturam a sua mão e não param de balançá-la. Eles ficam balançando e falando ao mesmo tempo. Isso me angustia, porque, se eu puxar a mão, parecerá falta de educação. E, se mantiver a mão, parecerá que estou gostando daquela sacudidela sem fim.
Conheço sacudidores de mãos furiosos. São afetuosos, sei, eles sacodem a minha mão com tanto entusiasmo porque estão felizes de me ver. É bacana, mas, em certo ponto, começa a incomodar. Quando é que vai parar com aquilo? Dá vontade de gritar:
— Me larga! ME LARGA!
Claro que não farei isso. Assim como não recusarei apertar uma mão mesmo que ela esteja pingando de suor, como sói acontecer. É verão, 40 graus e o sujeito vem de lá todo suado. Você vê que ele está gotejando e sabe que ele lhe oferecerá a mão. É inevitável, ele fará isso, você o conhece. Não há como recuar, não há como sair correndo, aquela mão lustrosa, úmida e gorda já vem na sua direção e vem toda aberta, pronta para um bom apertão. Você sente uma aflição, você quer fugir, mas é tarde, a mão chegou e você a aperta. Sente o suor do outro penetrando-lhe os poros, mas continua sorrindo, impávido e lívido ao mesmo tempo.
Por delicadeza, perdi a minha vida, já dizia Rimbaud.
Não, não gosto de apertar mãos. Os americanos é que estão certos: eles apertam a mão de alguém uma única vez na vida, quando conhecem a pessoa. Depois, nunca mais, só troca de sorrisos a uma distância segura, nada de troca de germes.
Sempre pareceu antipático da minha parte, isso de não ser um apertador de mãos. Agora, a pandemia veio me redimir. O soquinho está bom. Menos pessoal, é verdade. Mas muito mais higiênico.