Antes, as pessoas diziam:
– Aquele lá é um baita dum “provalecido”!
O certo é “prevalecido”, mas acredito que o provalecido se popularizou por ter mais força. Um provalecido, afinal, precisa ser forte. Porque (vamos empregar a forma correta) o prevalecido é nada menos do que o antigo valentão, o atual bully – aquele que pratica bullying.
Todo lugar tem um desses seres abjetos. A grande questão é: como enfrentá-los?
Meu avô me contava que a fábrica em que ele trabalhava quando guri tinha um sujeito assim. Escrevi “quando guri” e não exagerei – já aos 10 anos de idade meu avô esmigalhou o dedo indicador da mão esquerda no torno de uma fábrica de sapatos de Hamburgo Velho. Num tempo sem proteções trabalhistas, como sonham os liberais extremos de hoje, o gerente simplesmente enrolou o dedo dele em um pano e o mandou para casa. Para toda a vida, meu avô ficou com o dedo torto, em gancho. Eu gostava daquele dedo, achava até uma distinção e pensava que meu avô não se importava com ele. Mas, um dia, eu o ouvi falar que acalentava o sonho de usar um anel. Estranhei:
– E por que tu não compra um anel, vô?
Ele estendeu os braços, abriu os dedos e perguntou:
– Como é que vou usar um anel nessas mãos?
É como tem de ser: se o seu inimigo for mais forte, não o enfrente com as mãos limpas, não vá para campo aberto, nem para o meio do ringue
Mas o que interessa é que havia um valentão na fábrica em que ele trabalhava. O rapaz, mais velho e maior, vivia provocando-o. Todas as manhãs, ele o empurrava, ele o ameaçava, ele tornava um inferno a sua vida, que já não era fácil. Até que um dia meu avô traçou um plano. Deixou ao alcance da mão uma fôrma de sapato. Você sabe como é uma fôrma de sapato? É uma barra de ferro com uma espécie de pé de madeira na extremidade, pesada, quase uma maça medieval. Foi essa arma que meu avô empunhou, disfarçadamente, enquanto o valentão se aproximava no começo daquele dia, quase cem anos atrás. Meu avô fez de conta que não via que ele vinha, fez de conta que estava concentrado no trabalho. Permaneceu de cabeça baixa, simulando distração, mas monitorando a chegada do valentão. E, no instante em que o bully tocou em seu ombro para caçoar dele, ele não vacilou: girou o corpo, soltou o braço e acertou o outro BEM NO MEIO DA CARA com o pé de madeira da fôrma. O grandão grunhiu, rodopiou e desabou com o golpe. Meu avô ia finalizar o trabalho, mas viu que o rosto dele havia se transformado em um xisbúrguer e desistiu.
Nem preciso dizer que nunca mais o rapaz o incomodou, mas digo mesmo assim.
É como tem de ser: se o seu inimigo for mais forte, não o enfrente com as mãos limpas, não vá para campo aberto, nem para o meio do ringue. Planeje. Faça uma estratégia. Proteja-se. E ataque de inopino, com decisão e violência. Surpreenda o biltre!
É o que o Grêmio tem de fazer para bater o Flamengo no dia 23. Precisa dissimular, precisa se fechar, precisa atacar só na hora certa. Ou vai levar uma surra.