Você quer vencer o candente debate em seu grupo de WhatsApp?
Pergunte-me como.
Pensando bem, nem precisa perguntar. Darei algumas dicas de graça. A primeira:
O que quero dizer é que a Bíblia, por ser considerada sagrada e por ser tão vasta, pode embasar qualquer argumento, para qualquer lado.
Se você conhece razoavelmente a Bíblia, pode usá-la como argumento em qualquer discussão, sob qualquer ponto de vista, a favor ou contra, proibindo ou liberando, prendendo ou soltando. Você sempre encontrará uma passagem que endossará o seu pensamento com o selo “Garantido pelo Texto Sagrado”, até porque a Bíblia, ou, em grego, “O Livro”, não é “o” livro, mas legião, porque são muitos, mais de 50.
O Velho Testamento, por ser velho e múltiplo, é mais espetacularmente contraditório do que o Novo. Há episódios sangrentos, lascivos, injustos e cruéis, alguns patrocinados pelo próprio Jeová, na época chamado de “O Deus dos Exércitos”.
Um exemplo: quando Moisés estava errando pelo deserto com os hebreus à procura da Terra Prometida, um homem foi surpreendido apanhando lenha no sábado, o que era proibido pela lei. Moisés ficou em dúvida sobre o que fazer com ele, mas o Senhor não hesitou. Disse a Moisés, com sua voz de Correspondente Esso:
“Este homem deve ser condenado à morte! A comunidade toda o apedrejará fora do acampamento”.
Foi o que eles fizeram. Porque o coitado estava apanhando lenha.
Outro exemplo: você lembra daquele grupo vocal chamado Boney M, que fez sucesso décadas atrás? Talvez a música mais conhecida deles seja Rivers of Babylon, ou Os Rios da Babilônia. A letra é nada menos do que o Salmo 137, que chora a conquista de Israel pelo rei Nabucodonosor. Os hebreus foram arrastados para a Babilônia e lá permaneceram décadas como escravos. Os cantores do Boney M entoam o começo do Salmo:
“À beira dos rios da Babilônia
Nós nos sentamos a chorar,
Com saudade de Sião”.
Mas eles não cantam o final terrível do Salmo, quando os hebreus clamam por vingança, assim:
“Filha de Babilônia, devastadora,
Feliz de quem te devolver o mal que nos fizeste!
Feliz de quem agarrar e esmagar
Teus recém-nascidos contra a rocha!”
Os caras queriam atirar nenezinhos na rocha!
O Novo Testamento, por contar basicamente uma única história, a de Jesus, tem mais lógica, mas ainda assim pode se dar a diferentes interpretações. Essa curiosa categoria de “cristãos armamentistas”, que grassa hoje pelo Brasil, rangendo os dentes na internet, pode argumentar a favor da liberação das suas amadas armas usando um trecho do livro escrito por Mateus, em que Jesus diz:
“Não penseis que vim trazer paz à Terra! Não vim trazer paz, mas, sim, a espada!”.
O problema é que seria um sofisma. Porque, quando Jesus faz essa frase, está advertindo que suas ideias causarão divisão e disputa entre os homens. Ele não prega a utilização da espada, mas sabe que, por causa dele, a espada será utilizada. E estava certo. Vide as Cruzadas e os conflitos que até hoje atormentam o Oriente Médio.
O que Jesus pensava mesmo a respeito de armas aparece mais tarde, quando ele recebe o beijo de Judas e é preso pelos romanos. Pedro corta a orelha de um dos legionários com sua espada e Jesus manda que ele a guarde porque “quem viver pela espada, pela espada morrerá”.
O que quero dizer é que a Bíblia, por ser considerada sagrada e por ser tão vasta, pode embasar qualquer argumento, para qualquer lado. Use-a, no seu grupo de WhatsApp. Sempre funciona.
Há outra fonte inesgotável de argumentos que você pode empregar para vencer uma discussão. Vou contar qual é na próxima coluna.