Que diferença faz o Lula estar preso ou estar solto? Nenhuma, a não ser para o próprio Lula, sua família e seus amigos. Lula não é exatamente um homem perigoso e a possibilidade de que ele volte a cometer os crimes que cometeu é remota, uma vez que está apartado do poder. A grande questão desta decisão do ministro Marco Aurélio, de libertar os condenados em segunda instância, portanto, não é a libertação de Lula. A questão é que fica comprovado que o Brasil é uma várzea jurídica.
Marco Aurélio tem certeza de que a Constituição proíbe a prisão antes de se esgotarem os recursos. Há outros juristas que pensam da mesma forma. Mas há muitos juristas que pensam o contrário, inclusive alguns colegas de Marco Aurélio no Supremo. Um deles, Gilmar Mendes, pensava de um jeito antes; agora pensa de outro. O homem mudou de ideia.
Mas, se cada um tem uma opinião diferente sobre o mesmo assunto, como o brasileiro comum poderá respeitar as decisões da Justiça?
Quem está certo? Todos são juristas de notório saber, todos são respeitados e respeitáveis, todos têm vasta experiência, são lidos, são cheios de argumentos.
Onde está a tecnicidade da lei brasileira?
Onde está a ciência do direito?
Onde está a segurança jurídica?
Vamos tomar um caso bem menos grave: a liberação da venda de bebidas alcoólicas nos estádios de futebol. Desde 2008, a bebida estava proibida nos estádios. Agora, uma nova lei permite a venda de álcool até o fim do primeiro tempo.
Por que esse prazo foi estabelecido?
Há algum estudo recomendando isso?
Há alguma pesquisa a respeito?
Há números que indiquem o quanto a bebida é nociva nos estádios?
Ou tudo depende do que “acha” o legislador?
Então, o legislador “acha” algo, vai lá e faz uma lei. Seus colegas a aprovam, e isso pode se dar por conveniências ou troca de favores, talvez por convencimento ou até desconhecimento do que será votado. O executivo, pelas mesmas razões, sanciona a lei. Finalmente, um sujeito qualquer, um brasileiro comum, é acusado de ter infringido essa lei. O brasileiro é arrastado aos tribunais. Neste momento, tudo pode acontecer. Se nosso brasileiro comum pechar em um juiz duro, que tenha uma interpretação dura da lei, ele será condenado. Se cair no colo de um juiz bonzinho, com interpretação boazinha da lei, ele será absolvido. Não depende da lei, depende do que o juiz pensa da lei. Ou do dia, porque, se for um Gilmar Mendes da vida, hoje ele pensa que está tudo certo e amanhã ele pensa que está tudo errado.
Nesta mesma semana, em outro tribunal, ocorreu mais um julgamento ilustrativo do que digo: no TCU, um juiz havia se declarado impedido de julgar uma causa. Quando ele percebeu a decisão que seus colegas tomariam, manifestou-se novamente e declarou-se desimpedido. As razões pelas quais ele havia se considerado impedido não mudaram, mas ele simplesmente se desimpediu porque achou que deveria se desimpedir.
Hein???
No Brasil, a Justiça não é cega, ela é tonta. Não dá para deixar uma espada na mão dela.