– O Batman morreu!
Sussurrei a frase meio que para mim mesmo, estremecido de contrição, assim que fui atropelado pela notícia da morte de Adam West, no fim de semana. Meu filho ouviu e exclamou:
– Não! O Batman? Quem foi? O Coringa?
Olhei para ele. Ele ria. Será que, aos nove anos de idade, esse guri está gozando do pai? Pode ser. Mas talvez não.
Aos nove anos de idade, a gente ainda é inocente. A gente ainda acredita na Justiça. Eu, pelo menos, acreditava na Justiça, e a Justiça era o Batman. Todos os bons valores que eram ensinados às crianças eram incorporados pelo Batman. O Batman verdadeiro, não esses que fazem biquinho e falam com a voz do Don Corleone.
O Batman era bom, não fazia mal a ninguém. Num desses filmes de Batmans falsos, ele dá um tiro em um bandido. Fiquei chocado no cinema. O Batman de verdade jamais faria isso. Ele era contra as armas. O Batman de verdade nunca infringiria uma lei, com a possível exceção da dos limites de velocidade. Afinal, o Batmóvel tinha pressa. O Batman de verdade não socava um vilão se ele estivesse de óculos.
O Batman de verdade ajudava velhinhas a atravessar a rua, respeitava bichos, mulheres e crianças. Mulheres, até demais. A Mulher-Gato vivia se insinuando para ele, e ele resistia como um budista, só porque ela era do mal. Aquilo me deixava nervoso. A melhor de todas as mulheres-gato, melhor do que Michelle Pfeiffer, melhor do que Halle Berry, a melhor foi uma que tinha sobrenome de zagueiro do Grêmio: Julie Newmar.
Eu amava a Julie Newmar-Mulher-Gato. A cintura daquela mulher-gato podia ser circundada com os polegares e os indicadores unidos. Como qualquer felino, ela era flexível, traiçoeira, manemolente e sensual. Ficava ronronando no ouvido do Batman, e ele quase. Sempre quase. Irritante.
Tenho certeza de que o ator, o Adam West, era igualzinho ao Batman que interpretava. A cara dele não me enganava. Sou a favor do método lombrosiano como primeiro instrumento do julgamento de caráter. Se você olhar bem para uma pessoa e não deixar o seu intelecto interferir na avaliação, sentirá coisas reais acerca da personalidade dela. Preste atenção às primeiras impressões. Leve-as em consideração. São informações valiosas.
Pois o Adam West, você olhava para ele e via uma pessoa do bem. Uma pessoa que não machucaria ninguém, que não incomodaria ninguém, que só queria sair por aí com a sua capa e eventualmente salvar a cidade dos planos malignos de algum supervilão. Não havia malícia no Batman, não havia malícia na infância, os bandidos usavam máscara ao invés de gravata, a Justiça sempre vencia no fim.
A Justiça... Que saudade da Justiça... E da Mulher-Gato. Um mundo justo e com a Mulher-Gato dentro dele é muito melhor.
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David Coimbra
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