David Coimbra

David Coimbra

Colunista de ZH e GZH e comentarista da Rádio Gaúcha, teve 18 livros publicados. Prêmios: 10 ARI, Esso de Reportagem, Direitos Humanos, Habitasul de Literatura, Erico Verissimo de Literatura, Açorianos de Literatura, entre outros. David faleceu em 27 de maio de 2022 após 10 anos de luta contra o câncer. Suas crônicas seguirão disponíveis em GZH.

Apelidos

Será Humberto, Roberto ou Florisberto? 

O Departamento de Propinas era criativo

David Coimbra

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O Roys gostava de botar apelido nos outros. Foi ele quem apelidou o Jorge de Barnabé, por causa de um detetive de seriado chamado Barnaby Jones.

O Luiz Carlos era baixinho e gordinho. Virou Barril.

Já o Henrique tornou-se para sempre Diana, porque tinha uma cachorrinha com esse nome.

O Zoreia acho que também foi o Roys quem apelidou, porque ele vivia usando uma camisa estampada com o desenho do Topo Gigio, aquele ratinho italiano de orelhas enormes.

Mas, como o Roys era bem magrinho, algum gaiato começou a chamá-lo de Languiça, e ele ficou furioso. Bastava a gente gritar "e aí, Languiça!" e o Roys pedia briga. Um erro. Como inventor de apelidos, o Roys devia saber que o apelido pega, mesmo, quando o cara se importa.

Já contei do Meia Longa, não é? Meia Longa era personagem de propaganda de caderneta de poupança. Aparecia um coelho e tocava a música:

"Eeeeu sou o Meia Longa, coelho muito sabido, amigo das crianças, o multiplicadooor...".

Bem. Por algum motivo, apelidamos um baita negão, nosso vizinho, de Meia Longa. Nunca vi ninguém ficar tão brabo por causa de um apelido. Ele morava no térreo, a janela da sala dando para a rua. Nós íamos ali para a frente e cantávamos, em coro: "Eeeeeeeu sou o Meia Longa, coelho muito sabido...". Em um segundo, ele abria a porta e saía correndo atrás de nós. Gritava que ia nos matar e acho que mataria mesmo, se nos alcançasse. Era muito engraçado.

O Plisnou, você deve saber, é um aportuguesamento de please no, "por favor, não". A origem do apelido é uma piada horrível que o Jorge Barnabé contava. O Jorge Barnabé não sabe contar piada. Ele conta a Pior Piada do Mundo. Meu Deus, que piada medonha. A Pior Piada do Mundo é tão ruim, que estraga festas e espalha bolinhos. O Barnabé adora contá-la, mesmo que acabe com a noite. Ele disfarça, diz que é outra história e, quando estamos desprevenidos, ataca com a Pior Piada do Mundo. É muito desagradável.

A do Plisnou também é terrível, mas não tanto.

Hoje em dia, os brasileiros pouco colam apelidos uns nos outros. Estamos mais sérios. No futebol, por exemplo, os jogadores agora são chamados por nome e sobrenome. É uma das causas da decadência do futebol brasileiro. Perdemos a manha, entende? Atacante bom é atacante com apelido: Pelé, Garrincha, Didi, Vavá, Zico, Tostão, Zizinho, Palhinha, Fumanchu, Lula, Babá são muito melhores do que esses sujeitos com nome de contador: Alan Cardoso, Rodrigo Souza...

Mesmo zagueiros são melhores com apelido. No Próspera, de Criciúma, o becão Nivaldo era chamado de Churrasco devido ao que fazia com os atacantes.

Mas os dirigentes não gostam de apelidos. Uma vez, o Criciúma contratou o centroavante Cláudio Batata, do Inter. Antes de o jogador chegar, o vice de futebol do clube nos chamou, aos repórteres, e pediu:

– Não chamem o cara de Batata. Chamem de Cláudio. Por favor...

Tudo bem, decidimos acatar. Aí, olhei para o pátio do estádio e vi aquele tipo chegando. Era um alemãozinho retaco, o nariz redondo. Parecia uma batata caminhando. Só podia ser ele. Aproximei-me e perguntei:

– Tu és o Cláudio?

E ele:

– Não. Eu sou o Batata.

Rapaz de personalidade.

Agora, neste tempo de escassos apelidos, fiquei encantado com a criatividade do pessoal do departamento de propinas da Odebrecht. Eles botavam codinomes nos políticos financiados pela empresa. Palocci era o Italiano. Meio óbvio, talvez. Mas os políticos gaúchos não tinham pseudônimos tão óbvios assim. Verdade que, nas mensagens interceptadas pela polícia, há um Betão, que provavelmente é Roberto, Humberto ou Florisberto. Mas também há o Legislador, que é imponente demais, deve ser ironia. E consta o Animal, que pode ser elogio ou xingamento. E ainda os misteriosos Três e Zambão.

Quem serão eles? Faça o seu palpite.

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