Nunca vi nada igual: um elevador de três andares com ascensorista. O primeiro, é a garagem. Como ex-usuário de cadeira de rodas e momentaneamente usando um andador para conseguir me movimentar, prezo ainda mais pela acessibilidade — aliás, um dia ainda vou falar sobre isso. Mas elevador com ascensorista para três andares não tem a ver com acessibilidade. É luxo mesmo.
Vi isso no Senado, em Brasília. Minha primeira reação foi de ironia pela situação. Pensei melhor e raciocinei como jornalista e cidadão assistindo, ao vivo, ao desperdício de dinheiro público. Questionei o administrador do Congresso, que me respondeu que se tratava de um empregado pertencente a uma empresa terceirizada. Ora, mas é desperdício igual!, respondi.
Com origem na Roma na época da República, a palavra Senado é derivada de Senex (idoso). Sei que o Senado brasileiro (81 senadores e senadoras) é uma Casa com pessoas de mais idade. Mas precisa um elevador de três andares ter uma pessoa só para apertar botão? Claro que não, é a reposta. Eles fazem isso porque não é do bolso deles que sai o salário. A origem é o orçamento do Congresso, ou seja, dinheiro nosso.
Aproveitei o período de convalescença para assistir à CPI da Covid no Senado. No final, um locutor de Brasília narrava os passos seguintes. Disse:
— Agora, o senador Renan Calheiros (MDB-AL) — o relator da CPI — vai redigir o relatório.
Pensei: Vai mesmo? O senador tem 51 assessores. A média salarial era, até recentemente, de R$ 13.599. Quantas empresas têm 51 funcionários com salário de mais de R$ 13 mil? O senador deve ter passado os olhos no relatório que foi redigido por um ou mais dos seus 51 assessores. Calheiros, como presidente do Senado por dois mandatos, nunca tocou no assunto da redução de exorbitâncias, muito menos propôs qualquer debate sobre o assunto.
Aliás, aproveitei para levantar as despesas do senador reclamão Marcos do Val, do Podemos do Espírito Santo, que se queicou do suposto baixo salário. Além dos mais de R$ 33 mil por mês, ele empregou, até recentemente, 37 pessoas com salário mensal médio de R$ 12.895. Média, pode ser mais como pode ser menos.
Igualmente abusivo são os gastos com “planos de saúde” dos parlamentares. Senadores e ex-senadores têm direito à ressarcimento de despesas médicas. Em 2021, ano de pandemia, o gasto saltou de R$ 17 milhões, em 2019, para R$ 37 milhões. Muito mais abusivo que ascensorista em elevador.
Seria digno os senadores terminarem com essa mamata. O meu ceticismo em relação aos parlamentares me impede de acreditar que algo vá mudar, o que só depende deles mesmo. Um pouco mais digno seria o Senado instituir um plano de saúde ou que a Casa aderisse a um plano. Daí os nobres poderiam contribuir mensalmente como qualquer mortal.
Antes de publicar este texto, pedi a uma pessoa de minha confiança, que trabalha no Congresso e com muito anos de experiência, para verificar se o elevador do Senado com três andares continuava a ter ascensorista. Alguns minutos depois, essa pessoa me respondeu.
— Sim, e a Câmara (dos Deputados) também.
A Câmara fica no mesmo prédio do Senado, em Brasília. Ou seja, a frase antiga do jurista gaúcho Raymundo Faoro continua atual:
— A história do Brasil é um romance sem heróis.