Algumas ideias não merecem a honra de uma contra-argumentação. Admitir isso não significa ser contra a liberdade de expressão ou a favor da censura. É apenas uma questão de tentar manter elevados os índices da higiene atmosférica, além de uma estratégia para administrar de forma sensata o tempo e a inteligência - duas grandezas tão finitas quanto escassas para a nossa espécie.
Faz sentido discutir como adestraríamos um dinossauro caso um cientista russo conseguisse reproduzir um T-Rex 2.0 em laboratório? Sim, talvez, na ficção (e olhe lá…), mas não às ganhas, nos telejornais, no plenário do Congresso ou menos ainda em pronunciamentos públicos das autoridades da República. Discutir se a Terra é plana não é muito diferente, mas, por incrível que pareça, fomos obrigados a debater esse assunto como se fosse - sei lá - um assunto.
No século 21, temos alguns problemas graves para ocupar nossos melhores cérebros - e os piores também. Ainda assim, perdemos tempo, desperdiçamos energia, abatemos espíritos. Cada vez mais, ideias desvairadas e personalidades mitômanas têm sequestrado o debate público sem qualquer tipo de cerimônia ou autocrítica: negação do aquecimento global, desconfiança em relação às vacinas, defesa de remédios que vendem esperanças falsas, ataques a inimigos fantasmas, disseminação de teorias conspiratórias… A lista não acaba, a paciência sim.
Pode parecer, à primeira vista, que o mundo simplesmente ficou bananas. Na verdade, o mais provável é que as pessoas não ficaram mais burras ou malucas nos últimos anos. Tudo leva a crer que a erosão do debate público é resultado de uma estratégia muito eficiente da extrema direita para avançar suas pautas: lança-se o antiassunto, todos se escandalizam e em seguida a boiada de leis deletérias e antidemocráticas passa assobiando a nossa frente.
Paul Krugman, vencedor do Prêmio Nobel de Economia em 2008 e colunista do jornal The New York Times há 20 anos, parece ter perdido a paciência com a conversa fiada mal-intencionada. Para ele, a neutralidade tornou-se não apenas impossível diante da má-fé de certas discussões, como moralmente insustentável.
Quando fatos já não abalam pontos de vista enrijecidos por uma seita ideológica, a inteligência morreu antes, ainda que continue caminhando e assustando criancinhas: “Ideias que deveriam ter sido mortas por evidências contrárias, em vez disso continuam arrastando-se pelas ruas, devorando cérebros”, diz Krugman. O título do seu último livro, lançado no ano passado nos EUA, não poderia ser mais eloquente - e deprimente: Discutindo com Zumbis.