
Não me recordo de um meio de semana tão trágico na estrada.
Foram 11 mortes no trânsito gaúcho em um intervalo de 12 horas, entre a noite de quarta-feira (12) e a manhã de quinta-feira (13): nove em rodovias estaduais, uma em rodovia federal e uma no trânsito de Porto Alegre. Entre as vítimas, o fotógrafo e artista visual Victor Hugo Cecatto, de 63 anos, num acidente na BR-158, em Cruz Alta.
Não dá para assistir à carnificina passivamente.
Há vários motivos para a avalanche de perdas: a situação precária das nossas estradas, a falta de acessos depois do maior desastre climático da nossa história, de maio do ano passado, que atingiu mais de 90% do estado.
Ao percorrer o Rio Grande do Sul para palestras, venho levando uma hora a mais em cada trajeto devido a condições adversas e paralisação de trechos. Exige-se uma tensão descomunal, própria de motorista profissional de rali. Você não consegue despregar o olho do horizonte, não consegue relaxar. Não há quem não deixe o carro com dores nas costas, aliviado de ter sobrevivido.
Eu sei que a letalidade costuma estar associada à velocidade, ao consumo de álcool, à direção perigosa e àqueles segundos de desatenção com o celular — de modo nenhum desmereço as campanhas de prevenção, extremamente necessárias —, mas o aumento desenfreado e abusivo de casos não pode ser somente creditado aos erros humanos. Há um tanto de cavernosa insalubridade nas autopistas.
Pagamos cada vez mais pedágios, e não existe tranquilidade e segurança de contrapartida.
Já estávamos numa crescente. De acordo com o Departamento Estadual de Trânsito (Detran), em 2024 aconteceram 1.507 acidentes com mortes, contra 1.432 em 2023 (acréscimo de 5,2%). O número de mortes no trânsito gaúcho foi de 1.652 em 2024, ante 1.576 em 2023, numa alta de 4,8%. Tudo sinaliza que desembocaremos num recorde macabro e precoce em 2025.
Não há quem não deixe o carro com dores nas costas, aliviado de ter sobrevivido.
Não tem como incentivar o turismo ou ampliar a nossa distribuição de produtos desse jeito. A enchente não terminou. Há muito para ser reparado. Tanto que a iniciativa privada tem colaborado para mitigar a crise viária. O projeto Reconstrói RS — da Federasul, do Instituto Ling e do Instituto Cultural Floresta, além da contribuição de outras empresas como RandonCorp, Gerdau, Metasa, Grupo Simon e Usiminas — idealizou e construiu dez pontes para possibilitar o deslocamento de cargas e a mobilidade de moradores, envolvendo as comunidades de Anta Gorda, Arroio do Meio, Coqueiro Baixo, Doutor Ricardo, Encantado, Ilópolis, Pouso Novo, Putinga, Relvado e Travesseiro.
Percebo que o governador Eduardo Leite não está parado, mas deve se sensibilizar ainda mais com a lista recente de óbitos e jamais cansar de procurar soluções, parcerias e cobrar recursos para a reconstrução imediata de nossas principais vias. Que seja uma prioridade absoluta de seu fim de mandato.
Recomendo, inclusive, sem nenhuma ironia, que ande menos de helicóptero e mais de carro oficial para acompanhar os danos e obstáculos.
Iria mencionar as piores rotas, mas não caberiam neste espaço. Talvez precisasse selecionar as raras exceções de trafegabilidade.
Conforme pesquisa da Confederação Nacional do Transporte — CNT do segundo semestre de 2023, 72,2% das rodovias do estado se encontravam nas categorias de regular, ruim e péssima. Sobravam menos de 30% ilesas e, desse contingente, 5% exemplares. Dos 8.798 quilômetros analisados do fluxo gaúcho, apenas 436 quilômetros estavam excelentes. Cerca de 70,1% das nossas estradas apresentavam sinalização regular, ruim ou péssima.
Isso antes da catástrofe. Imagine agora.