Eu fiz polissonografia.
Eu quero anular o resultado. Eu quero VAR.
Não vale.
É um exame importante, mas como você vai reproduzir o estado natural do seu sono com vários fios presos no seu corpo?
Você não pode se mexer. É como se estivesse amarrado a um poste. São colocados um eletrodo na região frontal direita, um na região central direita, um na região occipital direita e três na mastoide esquerda.
Não existe chance de passar uma noite agradável e espontânea. Qualquer um vai roncar, vai ter apneia, vai suar frio.
Você será reprovado por antecipação. Se não sofre nenhum desvio, com aquela experiência traumática, apresentará anomalias.
Quando fiz o teste, fui obrigado a dormir às 20h. Nem na minha infância dormia tão cedo assim. O sono não vinha. O pesadelo da ansiedade é que surgia no seu lugar.
Ainda por cima, o laboratório me deixou numa sala que parecia um escritório, sem blecaute, com um computador barulhento ao lado da cama e o visor luminoso da tela tirando a minha atenção.
E a cama era dura como adormecer no chão. E funcionários entravam e saíam por duas portas, sempre me despertando com seus acessos repentinos e imprevisíveis. Ficava conjecturando: “qual porta será aberta? A do fundo ou a da frente?”.
Não adiantava dormir de pijama, melhor seria deitar de jeans e camisa. Afinal, não desfrutava de privacidade.
Se batia vontade de ir ao banheiro, precisava de uma operação de choque para não perder os pontos dos sensores. Tinha que chamar alguém, a partir de uma campainha, para me ajudar.
Eu olhava para o teto, apagava um pouco, acordava assustado. Realizei blocos de dormência de uma hora e meia. A impressão é que não descansei, vivi uma guerra.
E a sede? Não havia como molhar a garganta. Nunca uma madrugada demorou tanto para acabar. Oito horas contadas em minutos no relógio do celular.
Tentei contestar a avaliação — a pior possível —, mas as autoridades médicas alegaram que aquela situação de martírio e abandono selvagem não alterava os dados.
Recomendaram o uso de um aparelho, o CPAP, sigla em inglês para Pressão Positiva Contínua nas Vias Aéreas.
A sensação é que transformei meu quarto numa UTI, com um trambolho que monitora e produz o oxigênio, uma máscara nasal que veda as vias respiratórias e um tubo que liga o aparelho à máscara. É uma espécie de nebulização sofisticada.
Experimentei três máscaras em três meses. Nenhuma se adaptava ao meu rosto estranho, meu céu da boca estreito, minhas narinas refratárias.
Eu me transformei num elefante para dormir, arrastando uma tromba artificial para a direita e para a esquerda, não encontrando uma posição ideal.
Casal moderno é isso: um com CPAP, e outro com protetor para bruxismo.
Como namorar? Como beijar? Como estabelecer juras românticas? Como dormir de conchinha?
Ninguém pensa na sobrevivência do romance e do carinho?
Se eu ronco, não salvo o meu casamento. Se eu ponho os tentáculos, não salvo o meu casamento.
Ser (roncando) ou não ser (com CPAP), eis a questão.