Eu sempre me preocupei com a melhor idade. Um dos meus livros adverte: cuide dos pais antes que seja tarde.
Não existe como nos isentarmos do planejamento do futuro de nossos tutores. Assim como eles programaram a nossa infância e adolescência, custearam os nossos estudos, cabe-nos zelar pela sua velhice. É uma contrapartida cada vez mais certa, já que a expectativa de vida aumentou prodigiosamente nas últimas décadas: de 60 anos passou para 76,4 anos.
Minha geração é chamada de “sanduíche”, a primeira historicamente a conciliar diferentes estratos etários na residência, tomando conta simultaneamente de pais idosos, filhos e netos.
O termo se refere a um estar “prensado” pelas demandas tanto de pais que reivindicam atenção quanto de filhos — inclusive netos — que também requerem observação constante e sustento financeiro.
Trata-se de um fenômeno global — as pessoas estão tendo filhos mais tarde, e seus pais estão vivendo mais —, mas que no Rio Grande do Sul ganha contornos urgentes, posto que o Estado é o mais idoso do país, com 2,1 milhões de habitantes com 60 anos ou mais, o equivalente a 20,15% da população.
Em 2022, há dois anos, sua presença correspondia a 15,76% da população. Houve um salto de 2,5% ao ano.
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), um em cada cinco moradores do RS é idoso. Estamos nos igualando ao Uruguai, que detém uma das taxas mais altas do mundo.
Nossa média de idade está em 38 anos. O que significa que, em 2070, 40% da população será idosa. Antes disso, daqui a nove anos, participarei das estatísticas.
A capital gaúcha está entre as 10 metrópoles com a população mais longeva do Brasil. Atualmente, Porto Alegre abriga 1,3 milhão de moradores, dos quais 21% — 292,2 mil indivíduos — têm 60 anos ou mais.
Não podemos utilizar os parâmetros de outrora. Desde já, devemos providenciar uma maior quantidade de lares e centros-dia, espaços de acolhimento destinados a pessoas com idade avançada que apresentem algum grau de dependência. Da mesma forma, começar uma campanha familiar para evitar o isolamento e o abandono, tendo em vista que nem sempre os pais e avós dispõem do apoio dos parentes e de cuidados especiais dentro de casa.
Para se ter ideia da gravidade dos maus-tratos nessa faixa, o Disque 100 registra uma média anual de 35 mil denúncias de violações de direitos humanos contra idosos no país.
A inversão da pirâmide também abre a necessidade de revisar a legislação.
Não é mais possível prosseguir com a obrigatoriedade de apenas 1% para empresas com mais de 100 funcionários, estabelecida pelo Estatuto do Idoso. É muito pouco.
O mercado de trabalho precisa se adaptar à transição demográfica, absorvendo uma mão de obra cada vez menos jovem.
Temos que dobrar as faixas, os assentos, os guichês das filas prioritárias, repensando por completo a distribuição urbana e ampliando as políticas públicas.
Não há mais como reservar 5% das vagas em estacionamentos públicos e privados para idosos, se estes representam o polpudo montante de 20,15% da população estadual.
Tampouco manter a porcentagem de 5% em cinemas, bancos e estádios.
Não há mais como deixar 10% dos assentos do transporte coletivo a esse grupo, se o contingente multiplicou desde a criação da lei (2003).
São 20 anos que nos separam das principais normas de proteção. A lei envelheceu junto.