Vou contar uma piada sem graça. Mas sua graça consiste em não ser uma piada.
Joãozinho caminha para a escola de manhãzinha, tropeça numa pedra e vê que ela esconde um bilhete. Pega o papelzinho e põe no bolso.
Ao se acomodar em sala de aula, decide espiar o que está escrito. A professora se encontra no meio de uma lição. Percebendo a distração do aluno, recolhe o bilhete e lê.
Fica horrorizada, e o manda para a direção.
A diretora tenta entender o que aconteceu. Joãozinho explica:
— No caminho da escola, tropecei numa pedra e vi um bilhetinho escondido. Fui olhar o que era na aula e a professora me expulsou da sala.
A diretora toma a folha, lê e fica horrorizada.
— Não posso admitir isso na escola. Você está expulso.
Joãozinho chega em casa. A mãe estranha a sua aparição muito cedo e pergunta:
— O que houve?
Joãozinho explica:
— No caminho da escola, tropecei numa pedra e vi um bilhetinho escondido. Fui olhar o que era na aula e a professora me expulsou da sala. Ela me mandou para a direção, a diretora leu e me expulsou da escola.
A mãe, então, disse:
— Quero ler!
Analisou uma por uma das linhas e ficou horrorizada.
— Vá falar com o seu pai!
Ele aparece no serviço do pai, que para tudo para socorrê-lo.
— O que foi, filho?
Joãozinho explica:
— No caminho da escola, tropecei numa pedra e vi um bilhetinho escondido. Fui olhar o que era na aula e a professora me expulsou da sala. Ela me mandou para a direção, a diretora leu e me expulsou da escola. Mostrei para a mãe e ela me mandou para cá.
O pai passa os olhos pelo papel e fica horrorizado:
— Não quero mais ver você pela frente.
Ele corre para a residência dos avós. O avô atende e busca consolar o neto. Pede para não chorar.
Joãozinho explica:
— No caminho da escola, tropecei numa pedra e vi um bilhetinho escondido. Fui olhar o que era na aula e a professora me expulsou da sala. Ela me mandou para a direção, a diretora leu e me expulsou da escola. Mostrei para a mãe e ela me mandou para o pai. O pai viu e me mandou para longe.
O vô não acredita que seja algo tão sério, já supõe uma injustiça. Desamassa o bilhete, lê e fica horrorizado.
— Vá embora, não posso dar abrigo para você.
Joãozinho, desesperado, sobe o Morro da Tevê. Lá ele vai ler o bilhete em voz alta, sozinho, sem ninguém por perto, e finalmente descobrir o motivo de tamanho ódio.
Ao atingir o topo do lugar, com o Guaíba ao fundo, levanta o papel com a mão direita, enche o pulmão de coragem e começa a leitura para toda a Porto Alegre ouvir. Só que vem um vento sorrateiro e leva a mensagem embora, para nunca mais.
Moral da história: jamais deixe alguém falar por você. Mesmo que seja tímido, mesmo que seja reservado, mesmo que não se expresse bem. Na boca de um terceiro, suas palavras podem ser distorcidas. Assuma a sua vida. Não dependa de um fiador para transmitir o que deseja. Talvez se transforme em vítima de segundas intenções, de interesses alheios à sua vontade. A versão do outro nunca será exatamente a sua versão.
Tampouco seja garoto de recados. Os mensageiros sempre arcam com as consequências.
Por último, não carregue o que não sabe do que se trata. Acabará sendo o único responsabilizado pelo conteúdo.