Gabriele Chimelo, advogada do escritório Scalzilli Althaus
Restrita até então às sociedades empresárias, a recuperação judicial foi ampliada. Em recente decisão, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) passou a permitir o acesso de produtores rurais a essa salvaguarda jurídica. Agora, apenas a comprovação da atividade primária, sem o vínculo obrigatório de dois anos na Junta Comercial como pessoa jurídica, possibilita o deferimento desse instituto.
A decisão possibilitará a qualquer produtor — seja pequeno, médio ou grande — tornar-se uma pessoa jurídica e recorrer a essa alternativa. Débitos anteriores à inscrição na junta, inclusive, estarão sujeitos ao regime. Esse entendimento é, sem dúvida, um importante e irreversível avanço. No entanto, deve ser observado com certa cautela. Isso porque parte significativa dos produtores confunde a renda da atividade rural com aquela que sustenta a estrutura familiar. É comum os recursos serem geridos em um caixa único. Ou seja, não há profissionalização e muito menos separação da gestão orçamentária nos negócios.
A medida, dessa forma, reforça a importância de uma gestão profissional na atividade primária. O produtor rural precisa, antes de qualquer coisa, aprender a ser empresário. É necessário romper com a enraizada falta de cultura administrativa, promovendo uma verdadeira quebra de paradigmas para que tenhamos resultados gerenciais mais eficazes no setor. A implantação de boas práticas de governança, com a criação de conselhos, instituição de processos de gestão, revisão da estrutura patrimonial e eventuais auditorias são caminhos para evitar o colapso e a consequente adesão ao regime.
É necessário romper com a enraizada falta de cultura administrativa, promovendo uma verdadeira quebra de paradigmas para que tenhamos resultados gerenciais mais eficazes no setor.
A recuperação pode, sim, ser a salvação de muitos negócios. Entretanto, ela deve ser feita apenas quando a empresa rural estiver minimamente preparada para esse enfrentamento, de forma ordenada e segura — afinal, somente produtores estruturados poderão ingressar. Caso contrário, haverá uma banalização da recuperatória.
A medida, por outro lado, acende uma luz de alerta. O risco do aumento no número ingressos de recuperações judiciais por produtores, que detêm linhas especiais de crédito, pode elevar os juros bancários. E o acréscimo nas taxas pode ser desastroso para a economia brasileira e, sobretudo, a gaúcha.
A recente decisão do STJ trouxe uma série de benefícios para os produtores. E o principal deles está, definitivamente, na necessidade de mudança de um padrão cultural que vigorou por anos nas famílias rurais.
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