Principal item de exportação do Uruguai para o Brasil, o leite foi colocado sob investigação pelo governo brasileiro. Suspensas por tempo indeterminado, após pressão da bancada ruralista e de entidades de produtores, as importações só serão retomadas se o país vizinho comprovar a origem do produto vendido. A suspeita é de que os uruguaios estejam fornecendo leite em pó fabricado em outros países, na chamada triangulação, para escapar da cobrança de impostos – já que entre os integrantes do Mercosul o produto tem isenção.
A investigação será acelerada para esclarecimento da situação o mais urgente possível, segundo o secretário-executivo do Ministério da Agricultura, Eumar Novacki. A previsão é de que o caso tenha um desfecho em, no máximo, 15 dias, com a possibilidade da ida de missão técnica brasileira ao país vizinho.
– Fizemos algumas tentativas de esclarecimentos com o governo uruguaio, e todas as respostas foram negativas. O fato é que há indícios concretos de triangulação que precisam ser averiguados – informa Novacki.
Caso a suspeita de irregularidade sobre a origem do leite em pó não se confirmar, o mercado será imediatamente reaberto, garante Novacki. Porém, se o comércio desleal for constatado, as medidas serão ainda mais duras, com possível sobretaxa do produto ou até mesmo bloqueio total. Neste caso, a decisão não será apenas do Ministério da Agricultura, envolverá também o Ministério das Relações Exteriores, esclarece o secretário-executivo:
– As ações são de proteção ao setor, mesmo que isso signifique algum desgaste nas relações comerciais dentro do Mercosul.
O anúncio do embargo temporário das compras do país vizinho foi comemorado por representantes do setor, que atribuem às importações parte da pressão no preço do leite no último ano.
– Todo o volume de fora acaba provocando uma concorrência a mais dentro do Brasil – argumenta Alexandre Guerra, presidente do Sindicato da Indústria de Laticínios e Produtos Derivados do Rio Grande do Sul (Sindilat-RS).
Preço do importado mais baixo do que o nacional
As indústrias alegam também que o leite uruguaio entra no mercado brasileiro a preços mais baixos do que o produto nacional – pressionando as cotações no mercado interno. O valor do leite caiu 30,6% em setembro, na comparação com igual mês em 2016, resultando em redução de quase R$ 0,50 no preço do litro pago ao produtor no país, conforme dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea/USP).
– O ideal é que fossem criadas cotas de importação, a exemplo da Argentina. Assim, evitaria o achatamento de preço com a enxurrada de leite vindo de fora a preço menor – acrescenta Guerra.
Segundo a indústria, a pressão ocorre mesmo quando o produto chega em menor quantidade, como neste ano. De janeiro a setembro, o Uruguai vendeu 47,339 mil toneladas de leite em pó ao Brasil, quantidade 39% menor do que no mesmo período do ano passado, quando totalizou 77,74 mil toneladas.
– Talvez a suspeita de triangulação fizesse mais sentido no ano passado.
De qualquer forma, o Brasil deve ter razões para a medida, caso contrário, criará um atrito desnecessário com um parceiro comercial que compra muito mais do que exporta para nós – analisa José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).
O risco de um mal-estar diplomático, segundo Castro, pode se refletir nas negociações do acordo entre Mercosul e União Europeia – atualmente em curso.
Por sua vez, o Uruguai ameaça recorrer à Organização Mundial de Comércio (OMC). A balança comercial brasileira em relação ao Uruguai teve superávit de US$ 1,45 bilhão em 2016, conforme dados do governo. Ou seja, o Brasil exportou muito mais do que importou do país vizinho