
Uma das características do outono no Rio Grande do Sul é uma frequência maior da passagem de ciclones extratropicais. Isso ocorre porque o fenômeno está diretamente relacionado às condições meteorológicas da época do ano e à localização geográfica do território gaúcho.
O que são ciclones extratropicais?
Ciclones extratropicais são sistemas de baixa pressão atmosférica — região da atmosfera onde a pressão do ar é menor do que a dos locais próximos — que se formam fora dos trópicos, nas latitudes médias, onde está o sul do Brasil. Eles podem se originar tanto no mar, quanto sobre o o continente, a partir do encontro entre massas quentes e frias.
— O ponto principal, quando falamos em fenômenos meteorológicos, é de onde eles tiram a energia. A energia dos ciclones extratropicais vem do contraste de temperatura, entre a massa de ar quente e a massa de ar frio. Quando essas massas se encontram, podem formar os ciclones extratropicais — explica o meteorologista Glauco Freitas, do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet).
No dia a dia da população, eles aparecem na forma de nebulosidade, chuva forte e de ventos intensos. Contudo, do ponto de vista meteorológico, os ciclones extratropicais são considerados elementos importantes para o equilíbrio da temperatura terrestre e para quebrar bloqueios atmosféricos, como os que provocam ondas de calor e estiagens, por exemplo.
— O ciclone extratropical vem para equilibrar a temperatura da Terra. Ele quebra certos padrões. É como um "remédio amargo". Por isso, é importante entendermos o nosso clima — pontua Freitas.
Por que durante o outono se tornam mais frequentes?
A frequência da formação é maior durante o outono porque, apesar do fim do verão, a Região Sul continua aquecida e começa a registrar mais massas de ar frio.
— Nessa época do ano, nós temos ainda essa massa de ar muito quente, oriunda do centro do país, que avança para nós. Já há também um ingresso maior de massas de ar polar. Esse contraste de temperatura, que chamamos de gradiente, é muito forte nesse período. No inverno, está mais equilibrado. No verão, todo o país está quente, então não há todo esse contraste — pontua o meteorologista.
Conforme a Climatempo, no verão o Sul do Brasil é dominado por ar quente e úmido, e a influência das massas de ar frio vindas da Antártica é muito menor. Assim, o contraste de temperatura entre o ar tropical (mais quente) e o ar polar (que também está relativamente aquecido no verão) é mais fraco.
O ciclone extratropical vem para equilibrar a temperatura da Terra. Ele quebra certos padrões. É como um "remédio amargo"
GLAUCO FREITAS, METEOROLOGISTA DO INMET
Com a chegada do outono, o Hemisfério Sul passa a receber menos radiação solar, e as massas de ar polar começam a se resfriar de forma mais acentuada. Enquanto isso, o interior do continente continua aquecido. Esse desequilíbrio aumenta a diferença térmica entre as regiões polares e tropicais, criando um ambiente favorável para o desenvolvimento desses sistemas.
— Esse aumento do contraste térmico fortalece uma corrente de ventos em altos níveis da atmosfera chamada jato polar, que funciona como um "trilho" para a passagem de ciclones extratropicais. Durante o outono, esse jato se intensifica e passa a circular mais próximo do Sul do Brasil, o que facilita a formação e o deslocamento de ciclones ao longo da costa da Argentina, Uruguai e do Rio Grande do Sul — adiciona o meteorologista Guilherme Borges, da Climatempo.
Conforme o especialista, o Rio Grande do Sul é especialmente vulnerável a esses sistemas por estar localizado em uma zona de encontro frequente dessas frentes, próximo à região de origem de ciclones na região do Cone Sul.
Fenômeno deve se tornar cada vez mais comum
Considerando seu papel natural de regulador da temperatura, os ciclones extratropicais podem ser considerados uma manifestação do planeta com relação ao clima.
Dessa forma, tendo em vista as mudanças climáticas e o aquecimento terrestre, a tendência é que eventos meteorológicos como estes aconteçam em intervalos de tempo mais curtos.
— Os fenômenos devem ficar mais intensos, mais abrangentes e mais frequentes. Esse é o nosso novo normal e precisamos estar preparados para isso — conclui Glauco Freitas.
Ciclone extratropical e a enchente de 2024
Diversos fatores estiveram envolvidos no desastre climático que provocou a enchente no Rio Grande do Sul em maio de 2024, incluindo um bloqueio atmosférico, que manteve as áreas de instabilidade sobre o Estado e impediu o avanço de frentes frias, além de influências do fenômeno El Niño.
O meteorologista Glauco Freitas destaca que a tragédia climática ainda precisa ser melhor compreendida, não só a causa, mas também o que levou ao encerramento da sequência de chuva.
Conforme o especialista, umas das análises atuais é que um ciclone extratropical teria contribuído para a romper o padrão meteorológico de um período de muita chuva para um período mais seco.
Para a nova estação, um prognóstico do Inmet aponta que devem ser registrados momentos de chuva acima da média dentro dos próximos três meses. Contudo, apesar do outono ser uma estação mais propensa a precipitações mais intensas, em 2025, não há previsão de um acontecimento semelhante ao registrado no ano passado.

*Produção: Carolina Dill
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