A ativista sueca Greta Thunberg, 19 anos, tem afirmado que está cansada do "blá-blá-blá" das cúpulas do clima e já sinalizou que não deve participar da COP27, que ocorre até a próxima semana em Sharm el-Sheik, no Egito. Mas nem o desânimo de Greta, os altos custos para ir ao evento e as restrições impostas pela ditadura do país africano afastaram os jovens ambientalistas brasileiros — e de muitas outras nacionalidades — da conferência.
Se existe algo que faz falta até agora na COP são os protestos na frente da Zona Azul, onde os países montam seus pavilhões, e também a tradicional marcha de ativistas jovens no centro da cidade. O governo egípcio confinou os protestos a uma região longe da área central, e também do complexo que hospeda o evento.
Até quarta-feira (9) não havia sinal de que isso iria mudar. A única manifestação permitida era a de militantes veganos, alguns deles com fantasias de animais, distribuindo comida saudável na frente da COP - comida muito bem-vinda, por sinal, pois dentro do espaço de eventos há poucos quiosques de alimentação, todos com filas enormes e preços abusivos.
O governo egípcio está evitando protestos, mas os jovens continuam marcando presença na COP. Pela primeira vez, criou-se um pavilhão destinado a eles na Zona Azul. E é um dos espaços mais animados, sempre lotado, com gente de todos os cantos do planeta e dos 12 aos 30 e poucos anos.
Alguns figurões já passaram por lá, como o ex-prefeito de Nova York Michael Bloomberg. Há debates sobre todos os assuntos abordados na cúpula, mas sempre com enfoque destinado a um público jovem. Nas paredes coloridas, há papéis com mensagens de jovens do mundo todo sobre como combater a mudança climática.
Delegações
A intenção dos mobilizadores brasileiros neste ano foi levar o maior número que fosse possível de jovens participantes. A edição anterior da COP, na Escócia, foi uma das que mais levaram a nova geração para cobrar soluções urgentes para frear a catástrofe climática.
Neste ano, o Engajamundo, organização de liderança que visa a enfrentar problemas ambientais e sociais do País e do mundo, está representada por uma delegação de 19 membros, com ativistas da Amazônia, do Cerrado, da Mata Atlântica, da Caatinga e do Pampa.
Cada um deles quer trazer para o debate global questões e experiências ligadas ao próprio bioma onde vive. A presença no evento das Nações Unidas é um modo de reforçar o recado claro às lideranças mundiais: o tempo está se esgotando.
Sobre as acusações de Greta - de que as cúpulas climáticas têm muita conversa e pouca ação - os jovens do Engajamundo concordam, mas veem necessidade de mostrar presença.
— Todos os espaços de tomada de decisão são muito cheios de blá-blá-blá, mas não é por isso que a gente vai parar de ocupar eles — diz a cientista política Carolina Dias, de 22 anos, do Pampa gaúcho.
Um problema, reclama ela, é que a cada nova conferência aumenta a distância entre líderes e sociedade civil.
— Os espaços onde é possível fazer ações de ativismo são muito restritos e inacessíveis. Os negociadores estão lá na zona verde, que fica bem distante (da azul). Os negociadores acabam não vendo as manifestações da sociedade civil — afirma.
Também do Engajamundo, o sergipano Frances Andrade, 26 anos, mestre em Ciências Florestais, destaca que Greta "abriu portas" para o ativismo jovem, mas avalia que é hora do Sul global ocupar esse espaço.
— Quanto mais rostos, melhor — defende.
Voz indígena
Para o indígena João Victor Pankararu, de 26 anos, o momento é de levar a voz deles aos quatro cantos do mundo, e não de retroceder. Ele, que esteve na Semana Climática de Nova York, está no Egito liderando um processo de formação de lideranças da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).
— Estamos tentando deixar nossa mensagem para os líderes globais — diz o jovem indígena:
— Quando a Greta diz que não vem, parece que nós jovens não queremos participar. Recai sobre todos os jovens, e não é verdade. Precisamos que outros escutem o que estamos falando.
Segundo ele, as regras mais rígidas no Egito não devem desanimar os participantes de ir para festas. O que muda, afirma, é a forma de protestar.
— Eles têm regras mais rígidas, então estamos fazendo atos menores — afirma.
Já para Pedro Tufic, do Impact Bank, talvez comece a surgir dissonância entre uma ativista branca e europeia com os jovens do Sul Global.
— Ela (a Greta) proporcionou o nascimento de um movimento que oxigenou o debate. Mas o Fridays for Future (movimento liderado pela sueca) não é só ela, tem capilaridade muito grande — diz.
Tufic diz que não estará na COP neste ano por compromissos de trabalho, mas não vê nas dificuldades impostas pelo Egito um obstáculo intransponível.
— Ano passado fomos em número recorde e acho que neste ano haverá ainda mais — afirma.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.