O Rio Grande do Sul está em chamas – e o bioma que mais sofre é o Pampa, típico gaúcho. Janeiro registrou 174 focos de queimada no Estado, o maior número dos últimos 17 anos para o mês e 222% acima do registrado no mesmo período do ano passado, segundo estatísticas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
O Rio Grande do Sul foi o 6º Estado com mais incêndios no país em janeiro, atrás apenas de Mato Grosso (556 focos ativos), Roraima (371), Mato Grosso do Sul (205), Pará (202) e Maranhão (185).
A região mais afetada é a Fronteira Oeste, mas o fogo também acomete intensamente o Noroeste e as Missões. Em menor intensidade, atinge Região Sul, Região Metropolitana e até a Serra, de acordo com o Corpo de Bombeiros Militar, que combate as chamas. As queimadas ocorrem, no geral, na zona rural, não urbana, afetando a população do Interior.
O grande impactado é o Pampa, bioma formado por vegetação campestre que ocupa mais de 60% do território gaúcho, mas com apenas 3% de área dedicada à preservação ambiental. O fogo queima mata nativa, insetos, répteis, aves, plantações de agricultores e até mesmo reservas ecológicas.
Entre os municípios mais atingidos, estão Uruguaiana, Santana do Livramento e São Borja, mas também cidades menores, como Quaraí e Itaqui. Porto Alegre está entre as cidades com maior número de queimadas, mas são de pequeno porte, segundo os Bombeiros. O fogo não gerou nenhuma vítima no Estado, mas queima espécies nativas do Pampa, como insetos, sapos e rãs, aves, engole plantações e mata até mesmo o gado.
Em Uruguaiana e Alegrete, o maior número de chamados para combate a focos de queimada ocorreu na metade de janeiro, quando diversas propriedades rurais foram atingidas por labaredas e tiveram enormes extensões de campos queimados. Animais morreram e estruturas foram destruídas, incluindo máquinas agrícolas e rede elétrica do interior dos municípios.
Na Fronteira Oeste, somente na Área de Proteção Ambiental do Ibirapuitã, em Alegrete, foram queimados 4.580 hectares. E, dos 4 mil hectares da Reserva Biológica São Donato, entre as cidades de Itaqui e Maçambará, cerca de 900 hectares foram consumidos pelas chamas, segundo a Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema-RS).
Nos 38 municípios cobertos pelo 11º Batalhão de Bombeiros Militar, cuja sede é em Santo Ângelo, nas Missões, um a cada três incêndios ocorreu em vegetação, terrenos vazios ou cultura agrícola.
— Em mata nativa, queimadas são problemáticas, pois este tipo de vegetação fica degradada pelo fogo. Obviamente, a perda de plantações é um problema econômico para os produtores. Em vegetação campestre, os impactos são menores, pois esses ecossistemas se recuperam mais facilmente, mas as florestas são sensíveis ao fogo. E tem impactos sobre ecossistemas associados, como riachos e rios, que podem aumentar processos de erosão, reduzir a vegetação de macrófitas (plantas aquáticas) e causar aumento da insolação e temperatura da água — diz o engenheiro ambiental Gerhard Overbeck, pesquisador do Laboratório de Estudos em Vegetação Campestre e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Há equipes de bombeiros espalhadas pelo Estado para combater o fogo, mas os incêndios costumam acontecer em zonas rurais, enquanto a corporação está concentrada na zona urbana, onde há mais pessoas; e a maioria dos caminhões d’água são preparados para circular em cidades, não na mata nativa.
Especialistas entrevistados por GZH são unânimes ao apontar o grande motivo para as queimadas: a intensa estiagem atravessada pelo Rio Grande do Sul, que reduz chuvas e deixa solo e vegetação secos, transformando-os em combustível para fogo, para além de arruinar colheitas.
Diferentemente das queimadas na Floresta Amazônica, onde incêndios começam de forma criminosa por pecuaristas e agricultores que desrespeitam leis ambientais, as chamas no Rio Grande do Sul normalmente iniciam por acidente, dizem autoridades: bitucas de cigarro atiradas ao chão, lixo queimado, fios desencapados na estrada ou objetos metálicos e de vidro jogados no solo que geram foco de luz e combustão.
— Há três processos de desastres naturais que assolam o Rio Grande do Sul: inundações, vendavais e estiagem. Mas este período de estiagem tem sido cruel. O material orgânico fica suscetível a inicio de incêndio por qualquer fator. Atendemos a 2.091 ocorrências de 1º a 20 de janeiro — afirma o subcomandante-geral do Corpo de Bombeiros Militar, coronel Otávio Polita Filho.
Para piorar, o Rio Grande do Sul está no auge do verão, quando os dias são mais longos e há mais tempo de luz solar. Portanto, a atmosfera fica mais tempo aquecida, o que seca o soco e evapora a umidade das plantas, tornando a vegetação mais propícia para queimadas. Os poucos dias de chuva não foram o suficiente – nos temporais, a grande quantidade de água não é retida, mas escorre do solo, o que torna a vegetação seca novamente dias depois.