Sete cidades do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina estão unidas na busca por se tornarem o segundo geoparque chancelado pela Unesco no Brasil. De sexta-feira (12) até a próxima terça-feira (16), dois representantes do órgão percorrerão as gaúchas Cambará do Sul, Mampituba e Torres e as catarinenses Praia Grande, Jacinto Machado, Timbé do Sul e Morro Grande. Juntas, elas formam o Geoparque Aspirante Caminhos dos Cânions do Sul.
A missão da Unesco é a penúltima etapa de avaliação da região, cujo território tem de 2.830 km² e engloba 73.518 habitantes. Os dois representantes, vindos de Portugal e México, serão acompanhados por pesquisadores do Serviço Geológico do Brasil-CPRM (SGB-CPRM), empresa pública vinculada ao Ministério de Minas e Energia.
Capitaneado pelo Consórcio Caminhos dos Cânions do Sul, o projeto de geoparque iniciou-se em 2012. Os pesquisadores em geociências Michel Marques Godoy, Raquel Binotto e Wilson Wildner, do SGB-CPRM, executaram os estudos e a elaboração da proposta de criação do geoparque.
De acordo com a proposta do consórcio, o objetivo de tornar o trecho um geoparque baseia-se no potencial geoturístico dos Aparados da Serra. Trata-se da região com maior concentração de cânions no Brasil, apresentando grandes escarpas que atingem até 1.157 metros de altura, com extensão total de 250 km.
A combinação da geologia local com a biodiversidade da Mata Atlântica e os geomonumentos da planície costeira mostram o valor do parque para a geoconservação, turismo e geologia do país e do mundo. Além disso, a região é considerada patrimônio geológico nacional, com as unidades de conservação federais: os parques nacionais Aparados da Serra e Serra Geral.
E estas características estão entre as quatro principais buscadas pela Unesco para reconhecer uma área como geoparque, confirma o oficial de Projetos de Ciências Naturais da Unesco, Glauco Kimura. São elas: patrimônio geológico de valor internacional, gestão, visibilidade e intercâmbio com outros geoparques no mundo.
No roteiro da visita, os avaliadores percorrerão os principais geossítios, acompanharão atividades culturais e farão reuniões técnicas com prefeitos, comitê científico e equipe do consórcio.
— É uma luta de anos, iniciada em Praia Grande (SC). Eram 18 municípios e fixamos em sete. Precisamos a definir os pontos turísticos e cada município começou a aprimorar sua infraestrutura e a envolver a comunidade — ressalta o prefeito de Torres, Carlos Souza, presidente do Consórcio.
Conforme Souza, o reconhecimento representará, principalmente, novas oportunidades de divulgação internacional e valorização do turismo sustentável na região.
Candidato desde 2019
O projeto é candidato a geoparque desde 2019, quando enviou o dossiê à Unesco. Conforme Kimura, depois da visita, os representantes da missão terão um mês para encaminhar o relatório final ao conselho global de geoparques da Unesco para ser avaliado. Então, o estudo irá para a pauta da diretoria da Unesco, na reunião que ocorre na primavera do hemisfério Norte. Ou seja, o resultado deve ser divulgado até o final do primeiro semestre de 2022.
Se aprovado, o Caminhos dos Cânions do Sul será o segundo geoparque no Brasil a fazer parte da Rede Mundial de Geoparques — o primeiro brasileiro a ter reconhecimento internacional, há 15 anos, foi o Geopark Araripe, no Ceará. Atualmente, existem 169 geoparques globais da Unesco em 44 países. A rede foi estabelecida em 2004, numa parceria entre a Unesco e a União Internacional de Ciências Geológicas (IUGS), visando distinguir áreas naturais com elevado valor geológico, nas quais esteja em prática uma estratégia de desenvolvimento sustentável, baseada na geologia e em outros valores naturais ou humanos.
Pelo menos outros três geoparques brasileiros já estão na lista de aspirantes pela Unesco, um fica no Rio Grande do Norte e os outros dois, no Rio Grande do Sul: o geoparque Caçapava, em Caçapava do Sul, e o geoparque Quarta Colônia, que reúne os municípios de Agudo, Dona Francisca, Faxinal do Soturno, Ivorá , Nova Palma , Pinhal Grande , Restinga Seca, São João do Polêsine e Silveira Martins.
A formação dos cânions do Sul do Brasil
Segundo o geólogo Michel Godoy, a evolução geológica dos cânions do Sul começou com a fragmentação do supercontinente Gondwana que, após sua separação, originou três continentes, a América do Sul, a África e a Antártida. Há cerca de 130 milhões de anos, as movimentações das placas tectônicas causaram a separação dessa grande massa continental e despertaram um dos maiores eventos geológicos de todos os tempos, o vulcanismo Serra Geral. A grande região recoberta por esse vulcanismo ficou conhecida como Província Basáltica Continental Paraná-Etendeka que possui registros contínuos de rochas vulcânicas preservadas no Brasil, Paraguai, Argentina, Uruguai na América do Sul e Namíbia na África.
Este evento vulcânico ocorreu de forma incessante por aproximadamente 10 milhões de anos, sendo que, neste período, as lavas extravasaram por monumentais e incontáveis fissuras na crosta. A formação e a preservação das formas de relevo dos cânions do sul ou “Aparados da Serra” estão ligadas a questões geoquímicas dessas rochas que são resistentes a alteração e a forças de movimentação rúpteis da crosta, características que ajudaram a “talhar” as escarpas profundamente verticalizadas dos cânions.
O QUE É UM GEOPARQUE?
Geoparque é um território com limites definidos, com uma estratégia de desenvolvimento sustentável onde locais de relevância geológica internacional, assim como outros bens naturais e culturais da região, são promovidos com foco na conservação da natureza, na educação para a sustentabilidade e no desenvolvimento econômico por meio do turismo.
Ao ampliar a conscientização sobre a relevância destes locais que registram importantes momentos da história geológica da Terra, aliados à diversidade histórica e cultural das populações que ali vivem, os geoparques fortalecem a identificação das pessoas com este território, estimulando novas oportunidades de desenvolvimento econômico sustentável através da interação responsável com o meio em que vivem.