Laudo apresentado nesta sexta-feira (26) pela Polícia Federal (PF) aponta que o rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, em Minas Gerais, no dia 25 de janeiro de 2019, ocorreu por perfuração feita a partir da parte superior até a base da represa, onde os rejeitos ficam armazenados. A operação foi iniciada cinco dias antes da tragédia e estava em andamento na data da ruptura.
A perfuração estava sendo feita para diagnóstico das condições dos rejeitos depositados na estrutura e posterior instalação de equipamentos para medir a pressão interna da barragem.
O laudo refuta as argumentações da Vale de que uma combinação de deformação da barragem, provocada pelo seu próprio peso, e forte chuva teriam contribuído para o colapso. O documento mostra, em relação à chuva, que em 2019 o regime pluviométrico foi inferior a anos anteriores.
A perfuração, juntamente com o baixo nível do fator de segurança da estrutura, conforme já ficou comprovado nas investigações, levaram à ruptura por liquefação, que é o aumento do volume de água nos rejeitos sólidos, pressionando a barragem e levando à sua ruptura.
Conforme o perito da Polícia Federal Leonardo Mesquita, a liquefação ocorreu quando a perfuração atingiu, a 68 metros de profundidade, uma camada da estrutura com maior volume de rejeitos finos, que reúnem mais chances de entrarem em liquefação.
— A perfuração estava ocorrendo no ponto mais crítico da barragem — disse o perito.
Um fluido usado para lubrificar a ponta da perfuratriz aumentou a pressão nesse ponto mais frágil da represa. Antes de iniciar a perfuração que acabou provocando a liquefação, a Vale contratou empresa terceirizada, cujo nome não foi revelado pela PF, para fazer uma etapa inicial desse processo de análise dos rejeitos. A PF informou, porém, que os dados dessa primeira etapa, que durou de outubro a dezembro de 2018, não foram processados pela Vale, que mesmo assim passou à segunda etapa no processo em janeiro.
— Houve um atropelo. A Vale deveria ter verificado primeiro o que foi diagnosticado pela empresa contratada — concluiu o delegado responsável pelas investigações, Luiz Augusto Pessoa Nogueira.
O laudo divulgado nesta sexta é o mais importante para a possível responsabilização criminal de funcionários e diretores da Vale pelo colapso da estrutura. O rompimento da barragem matou 272 pessoas. Onze permanecem desaparecidas. O delegado responsável pelas investigações, no entanto, afirma que o inquérito segue e que ainda não há definição sobre possíveis indiciamentos.
Outras hipóteses levantadas desde o rompimento da barragem foram descartadas pela PF, além da apresentada pela Vale, entre as quais detonações em mina próxima à represa que poderia ter afetado a estrutura física da barragem.
A reportagem perguntou à Vale o motivo pelo qual a mineradora não processou as informações da empresa contratada para estudo sobre os rejeitos da barragem antes de iniciar a perfuração que acabou ajudando no gatilho da liquefação. Obteve a seguinte resposta, em nota:
"A Vale informa que tomou conhecimento nesta sexta-feira, 26, da expedição do laudo da perícia técnica da Polícia Federal sobre as possíveis causas do rompimento da Barragem I, da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG). A empresa avaliará o inteiro teor do laudo e oportunamente se manifestará nos autos por intermédio de seu advogado David Rechulski".