Por Marcelo Dutra da Silva
Professor de Ecologia na Universidade Federal do Rio Grande (Furg)
O presidente norte-americano Joe Biden tomou posse e logo em seguida foram assinados diversos atos executivos, muitos deles revertendo ações de Donald Trump, inclusive o retorno do país ao círculo do debate climático. A volta dos EUA ao Acordo de Paris é apenas o primeiro bom sinal das mudanças que estão por vir, no campo da política ambiental, a reboque das decisões da maior potência econômica do planeta. Mudanças que terão profundo impacto em todo o mundo, inclusive – ou principalmente – no Brasil.
Os novos rumos da política americana tendem a abrir oportunidades comerciais para o nosso etanol e para a soja, além de reforçar tendências em prol da conservação da biodiversidade e do desenvolvimento sustentável. E certamente vamos precisar lidar com questões relacionadas a desmatamento, queimadas, aprovação massiva de agrotóxicos, poluição... E vamos ter de incluir no nosso cardápio diplomático um elemento ainda pouco conhecido: a diplomacia ambiental.
Infelizmente, o rumo tomado pelo governo Jair Bolsonaro com relação ao meio ambiente tem confirmado as piores expectativas. Viramos alvo fácil de críticas lá fora, seja pelas coisas ditas em reuniões e conferências oficiais, sempre tentando negar os fatos, seja pela realidade que se impõe, diante das nossas piores escolhas. Alteramos o regramento legal, esvaziamos conselhos, fragilizamos a estrutura de fiscalização e controle. Estamos deixando “passar a boiada”, e o orçamento previsto para o Ministério do Meio Ambiente é o mais baixo em 21 anos.
É por meio dos nossos recados insanos que espantamos o mundo. Coisas do tipo “o aquecimento global é uma trama globalista”; os europeus deveriam “procurar sua turma” e deixarem de criticar a política ambiental brasileira”; não devemos nos preocupar com mudanças climáticas porque “é questão secundária”; estão mentindo, “a Amazônia não pega fogo e há uma campanha maldosa contra o Brasil”; somos o celeiro do mundo, “é só fechar a torneira da soja e eles vão ver”.
Precisamos mudar de estratégia.
De acordo com o embaixador Rubens Barbosa, presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior, o foco da comunidade internacional está na Amazônia, em vista do desmatamento, das queimadas, garimpo ilegal e do tratamento dado às comunidades indígenas.
A crença é de que os novos rumos na política econômica de Europa e EUA devem dar mais peso ao meio ambiente e devemos nos aprofundar na discussão sobre diplomacia ambiental e sua utilidade no debate sobre políticas ambientais – “É importante que examinemos maneiras de evitar que essa pressão externa e essas medidas prometidas possam acarretar prejuízos para os interesses econômicos, financeiros e comerciais brasileiros”, defende Barbosa.
Sem dúvida, vamos enfrentar fortes exigências, e mudanças na nossa agenda ambiental, por isso, serão necessárias. Infelizmente, perdemos a posição de líderes nas negociações e nos tornamos pária no campo das políticas públicas ambientais. A credibilidade que alcançamos ao longo de sucessivos governos já era e nos apontam como ameaça à sustentabilidade. Essa é uma questão que não se limita ao governo federal: as mudanças alcançarão as agendas dos Estados, sem dúvida. Aqueles que se adaptarem primeiro terão mais chance de sucesso nas negociações comerciais futuras.
Temos, portanto, uma oportunidade para revermos nossa posição de usuários da natureza, também por aqui, no Rio Grande do Sul. Podemos olhar com um pouco mais de carinho para o nosso potencial de geração de energia eólica e solar, de logística hidroviária, de produção orgânica em escala (de arroz e soja sem veneno), de criação de gado em campo nativo, extração e beneficiamento de rochas ornamentais, cultivo de madeira, de frutas e novas culturas, estímulo ao desenvolvimento de novas tecnologias, as indústrias verdes... Isso para citar algumas alternativas, pensando naquilo que já temos, na direção de um novo modelo de economia, baseado na sustentabilidade. É uma questão estratégica.