Setembro registrou marcas históricas de calor para o mês em todo o mundo, informou o serviço sobre mudança climática do programa europeu Copernicus. No Brasil, não foi diferente: Cuiabá, capital do Mato Grosso, por exemplo, chegou aos 44°C no último dia 30.
A área central do país está sob influência de uma grande massa de ar seco e quente que provoca o calor intenso, enquanto o Rio Grande do Sul vive dias não tão escaldantes — mesmo assim, há registros de mais de 30°C no norte do Estado.
Pode-se pensar que, para o Estado se manter em situação mais favorável do que boa parte do país, seja necessária a ação de alguma massa de ar frio de força fora do padrão. Mas o bloqueio é mais comum do que se pensa: tem todo ano.
Isso ocorre porque, nesta época, o RS é afetado por áreas de intensa umidade que o protegem do calor. É uma massa de ar vinda da Amazônia que entra no território gaúcho pela Argentina, causa chuvas e evita que o calor do resto do país desça para o Estado. Essa massa deixa a Amazônia e se desloca para perto da costa do Oceano Pacífico, de onde pode enveredar em direção ao sul do Brasil. Esse movimento explica por que a umidade não se propaga para Estados mais próximos ao Amazonas.
Meteorologista da Somar, Cátia Valente explica que essa diferença de clima entre o Rio Grande do Sul e as regiões Centro-Oeste e Sudeste é sazonal. São períodos em que há seca no centro do Brasil, enquanto os gaúchos desfrutam do clima mais ameno da primavera.
— Neste ano, em razão das queimadas, a temperatura, que já é elevada no Brasil central, subiu ainda mais. Tanto que a parte mais ao norte do Rio Grande do Sul, que não está tão "protegida" por essa umidade que está no Estado, também tem sofrido um pouco com o calor e a fumaça trazidos pelos ventos — explica Catia.
Algumas cidades do norte do Estado registraram temperaturas elevadas nos últimos dias em razão dos efeito, ainda que parcial, dessa onda de calor no Brasil central. Na terça-feira (6), Erval Grande atingiu 34ºC, a máxima para o Rio Grande do Sul naquele dia. Em Erechim, o pico chegou a 33ºC nesta quarta-feira (7), também a temperatura mais quente no Estado.
A tendência é que já neste final de semana a área de umidade migre do Rio Grande do Sul para Sudeste e Centro-Oeste, iniciando por lá uma temporada de chuvas e temperaturas mais baixas. Essa umidade ajudará a dispersar o calor que estava estacionado no Brasil central. Isso não significa, diz Catia, que o calorão de Cuiabá virá para o Estado.
— Por ora, não há sinal de que esse calor venha para o Rio Grande do Sul. No entanto, as temperaturas devem subir bastante com a proximidade do verão, dentro de uma sazonalidade esperada — diz Cátia.
Calorão mundo afora
De acordo com o Copernicus, o período de 12 meses entre outubro de 2019 e setembro de 2020 ficou 1,28°C acima da média das temperaturas da era pré-industrial. Levando em consideração que os últimos cinco anos foram os mais quentes da história, o dado aproxima o planeta do limite de 1,5°C, a meta do Acordo de Paris.
O calor também ficou acima do normal no Oceano Ártico, destaca o programa, ao recordar que este ano a camada de gelo na região terminou o verão com a segunda menor área da história, depois da registrada em 2012.
— A combinação, em 2020, de temperaturas recordes e de uma camada de gelo a um nível reduzido evidencia a importância de melhorar o controle em uma região com aumento da temperatura mais rápido que o resto do mundo — comenta Carlo Buontempo, diretor do programa europeu sobre mudança climática.
A América do Norte também teve um setembro muito quente, sobretudo com os 49°C registrados no início do mês no condado de Los Angeles, em uma Califórnia devastada por incêndios.