O Rio Grande do Sul teve registro de neve nesta quinta-feira em São Francisco de Paula entre 16h e 16h30min, conforme a Somar Meteorologia. O fenômeno, festejado por moradores da Serra, é mais comum do que os gaúchos imaginam, mas raramente forma o cenário idealizado por turistas, com paisagens cobertas por flocos de gelo.
O diretor do Centro Polar Climático da UFRGS Francisco Eliseu Aquino afirma que todos os anos, em ao menos uma vez, há registro de precipitação de neve em território gaúcho. O fenômeno, porém, passa despercebido na maioria das vezes:
— O Rio Grande do Sul tem neve, nem que seja de forma muito tímida, ao menos uma vez ao ano. Às vezes muito momentânea e em poucos locais, não é neve para cobrir gramado e árvores. Agora, do ponto de vista fotográfico, a cada dois ou três anos, temos um fenômeno mais interessante. Os dados das últimas décadas mostram que pode cair neve até em setembro, se houver condições meteorológicas e atmosféricas.
Segundo o climatologista, o Rio Grande do Sul raramente acumula neve na superfície pois, ao mesmo tempo em que é o Estado brasileiro mais próximo ao Polo Sul, está localizado em uma região subtropical, que tem invasão de ar quente mesmo no inverno.
— Esta é a massa de ar frio mais intensa desse inverno, mas não a mais vigorosa em relação a anos anteriores. Olhando as informações nos últimos dias, verifiquei que a intensidade dessa alta pressão não se sustentava, como os estudos mostram que é o ideal para neve. Talvez por isso a chance de uma neve mais efêmera. As condições eram próprias para neve, mas estamos num limiar muito crítico para se ter aquele floco de neve bonito. Ainda assim, esta noite está propícia para nova precipitação de neve.
O Rio Grande do Sul tem neve, nem que seja de forma muito tímida, ao menos uma vez ao ano. Às vezes muito momentânea e em poucos locais, não é neve para cobrir gramado e árvores.
FRANCISCO ELISEU AQUINO
Diretor do Centro Polar Climático da UFRGS
Também professor da Centro Polar e Climático da UFRGS, Jefferson Cardia Simões argumenta que o inverno gaúcho não apresenta frio suficiente para a formação e acúmulo de neve:
— As massas de ar polar que chegam aqui vêm pela Patagônia ou pelo oceano Atlântico. Quando sobem a Serra e há umidade, pode até formar cristais de neve, mas muitas vezes derretem no caminho na precipitação porque não faz frio o suficiente. Chega na superfície já em forma de água.
Já a chuva congelada — registrada nesta quinta-feira em cidades como Pinheiro Machado, Rolante, Riozinho, São José dos Ausentes e Nova Petrópolis — ocorre quando a gota d'água congela. Em um cenário de chuva turbulenta, pode ocorrer formação de granizo.
— A neve é a condensação direta de um cristal de gelo que, por este processo, vai crescendo conforme ocorre a precipitação. Tem a estrutura cristalizada. Se cai em lugar frio, acumula. Se o solo está quente, muitas vezes toca o chão e derrete na hora — explica Simões.
As massas de ar polar que chegam aqui vêm pela Patagônia ou pelo oceano Atlântico. Quando sobem a Serra e há umidade, pode até formar cristais de neve, mas muitas vezes derretem no caminho na precipitação porque não faz frio o suficiente. Chega na superfície já em forma de água.
JEFFERSON CARDIA SIMÕES
Professor da Centro Polar e Climático da UFRGS
Há duas condições fundamentais para a neve ocorrer: o frio e o vapor da água. De acordo com o professor, a massa de ar que traz neve deve chegar ao RS, preferencialmente, pelo oceano.
— Meu grupo de estudos investiga se a neve ocorre mais frequentemente quando a massa vem do Atlântico. A massa de ar que vem da Patagônia, que é a mais frequente, é a mais pobre de umidade — diz Simões.
A atual massa de ar frio que está sobre o Rio Grande do Sul, segundo Aquino, se formou no oceano Pacífico e ingressou na América do Sul pela Patagônia:
— O ar frio está cobrindo toda Argentina, indo em direção ao Paraguai e ao Rio Grande do Sul. O ar polar e a alta pressão que estão cruzando o continente estão em uma rota interessante para o frio invadir a América do Sul até o Sul do Amazonas — afirma Aquino.
A Serra gaúcha tem as maiores possibilidades de registro do fenômeno devido a altitude e porque registra as temperaturas mais baixas. De acordo com Simões, cidades localizadas a acima de 800 metros de altitude em relação ao nível do mar — como São Francisco de Paula, São José dos Ausentes e Cambará — são as mais propícias para a chegada da neve.
O polo frio do Brasil, de acordo com o professor, não se concentra no Rio Grande do Sul: está localizado na região do planalto catarinense, em cidades como Urupema, São Joaquim e Ubirici, onde anualmente as chances de acúmulo de neve são maiores.