A polêmica na Amazônia começou bem antes das queimadas virem aos olhos do público, com um episódio de conturbada relação do ex-presidente do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) Ricardo Galvão com o presidente Jair Bolsonaro e outros titulares da Esplanada dos Ministérios como o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. Relembre as questões envolvendo a floresta amazônica e o governo federal nas últimas semanas.
Contestação de dados do Inpe
Ainda em julho, o presidente Jair Bolsonaro contestou dados divulgados pelo Inpe sobre o desmatamento na região. Os números mostravam um aumento de 88% da desflorestação. A situação acabou gerando a exoneração do ex-diretor do instituto Ricardo Magnus Osório Galvão. À época, o presidente fez ilações sobre uma possível parceria entre o ex-diretor e organizações não governamentais (ONGs).
— Pelo nosso sentimento, isso não corresponde à verdade e parece até que (o presidente do Inpe) está a serviço de alguma ONG — disse em um café da manhã com correspondentes estrangeiros.
Frases como essas teriam legitimado ações como o Dia do Fogo, que aconteceu entre 10 e 11 de agosto, quando fazendeiros e grileiros teriam posto deliberadamente fogo em alguns locais da Amazônia, conforme noticiou o jornal Folha do Progresso, de Novo Progresso, no Pará.
Fim do Fundo Amazônia
Alemanha e Noruega, na última semana, anunciaram a suspensão do repasse de recursos para o Fundo Amazônia. A medida se deu após o aumento do desmatamento na Amazônia e de mudanças na gestão do fundo. Um eventual fim da entidade pode impactar as ações contra o desmatamento ilegal.
Nos últimos 10 anos, o fundo contou om 93,8% de verba da Noruega e 5,7% da Alemanha para ações de combate ao desmatamento e desenvolvimento sustentável. O Ibama seria um dos institutos afetados pelo fim do projeto. Recentemente, um acordo tinha sido firmado para que o instituto recebesse recursos para bancar "o pagamento dos meios de transporte adequados para as ações de fiscalização ambiental do Ibama".
Os recursos repassados ao Fundo Amazônia são utilizados para o combate de incêndios. Conforme levantamento do jornal O Estado de S. Paulo, de 10 caminhões especiais que o Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (Prevfogo) do Ibama tem hoje, seis foram comprados com repasses do fundo de proteção.
Resposta de Salles
Com o avanço do fogo nas florestas e com o dia virando noite em São Paulo na última segunda (19) em decorrência de uma espessa fumaça, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, falou em Sertãozinho (SP) na última terça-feira (20):
— Não há nenhuma omissão do ministério em relação a absolutamente nada. Muito pelo contrário. Nós, apesar das dificuldades orçamentárias, apesar do problema de infraestrutura, apesar de uma série de limitações que vêm administrações após administrações, estamos colocando eficiência administrativa para disponibilizar nesse exato momento todas as equipes.
Bolsonaro joga suspeita em ONGs
O presidente fez suas primeiras ponderações sobre o tema na quarta-feira (21), quando classificou como criminosa a série de queimadas pelo país e disse, sem provas, que ONGs de proteção ao meio ambiente podem estar envolvidas nos incêndios ilegais.
Ele também fez críticas aos governadores do Norte, que, segundo ele, não estariam se mexendo para resolver a situação.
— Pode estar havendo, não estou afirmando, ação criminosa desses ongueiros para exatamente chamar a atenção contra a minha pessoa, contra o governo do Brasil. Essa é a guerra que nós enfrentamos. Vamos fazer o possível e o impossível para conter esse incêndio criminoso. Olha só, tem governador, não quero citar nome, que está conivente com o que está acontecendo e bota a culpa no governo federal — disse.
Reação de ONGS
Ainda na quarta, as ONGs reagiram às frases do presidente. Em nota, a WWF Brasil afirmou que lamentava a nova tentativa do presidente Jair Bolsonaro de desviar o legítimo debate da sociedade civil sobre a necessidade de proteger a Amazônia. E ainda salientou que as acusações de Bolsonaro não se sustentavam frente ao dados divulgados pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Macron convoca G7 a entrar no assunto
O assunto chamou tanta atenção que chegou ao âmbito internacional. Além de celebridades mundialmente conhecidas se manifestarem, chefes de Estado também entraram no tema. O presidente francês, Emmanuel Macron, convocou a cúpula do G7 para discutir o assunto da Amazônia. Macron ainda se manifestou no seu Twitter.
"Nossa casa está queimando. Literalmente. A Floresta Amazônica – os pulmões que produzem 20% do oxigênio do nosso planeta – está em chamas. É uma crise internacional. Membros da Cúpula do G7, vamos discutir em dois dias este tema emergencial!", diz a postagem.
Antes de anunciar qualquer medida visando à diminuição do número de queimadas, o presidente Jair Bolsonaro, em sua conta no Twitter, rebateu as declarações do francês.
"Lamento que o presidente Macron busque instrumentalizar uma questão interna do Brasil e de outros países amazônicos p/ ganhos políticos pessoais. O tom sensacionalista com que se refere à Amazônia (apelando até p/ fotos falsas) não contribui em nada para a solução do problema", respondeu.
Nesta sexta-feira (23), Macron já falou em até mesmo suspender o acordo UE-Mercosul.
Redes sociais e repercussão
O assunto está há pelo menos três dias entre os mais comentados de redes sociais como Twitter, que, além de palco para discussões acaloradas entre os representantes dos países, tem mostrado a reação de celebridades e a convocação de manifestações pelo país e pelo mundo.
Um problema também tem se alastrado: o uso de imagens fora de contexto para comover sobre o tema, como a foto de um macaco da Índia sendo divulgada como se fosse na Amazônia. Até mesmo Macron usou a imagem de um fotógrafo morto para repercutir o assunto e Cristiano Ronaldo chegou a usar uma foto do Rio Grande do Sul de incêndio no Taim.
Bolsonaro anuncia que governo entra em ação
Ainda na noite de quinta-feira (21), Bolsonaro assinou um despacho que define que toda equipe ministerial tome medidas de combate à série de queimadas que vêm assolando o país. Está prevista para esta sexta-feira uma reunião ministerial para debater o tema. Estarão com ele no compromisso, os ministro da Defesa, do Meio Ambiente, das Relações Exteriores, o ministro-chefe da Secretaria da Presidência e o Secretário-Executivo da Casa Civil da Presidência da República.